Entre os Vendavais



Pedem demasiado, pedem que seja forte contra os vendavais. Esperam que seja firme nos meus propósitos e infalível na vontade. Que a coluna se amanse vergando, mas evitando a tensão para não quebrar.

Julgam que a delicadeza que alberga em cada ponto sedoso feito de pétalas, não é mais do que subterfúgios da sensibilidade natural. São todas iguais, segundo parece, no meio de tantas só basta apenas colher do solo o corpo delgado e flexível que balança ao vento, desconhecem-se as vontades e os sonhos. É só mais uma,  igual entre tantas que por aí se perdem em ânsias e devaneios. E mal se dão conta, que cada uma delas tem em si a diferença e a igualdade de toda a criação: a vida.

Essa vida que se precisa usar como se fosse o último dia, não vá a ventania arrancar do solo onde se prende tão acolhedoramente. Ou desperdiça-se em murchar sem florescer, meio que com  medo de tudo, dos zangões zumbidores e das gotas de chuva, "não me toques, não me vejas, deixa-me em paz". Outras em constante insatisfação, o poder criativo sublimado pela barreira física torna-se na tortura constante, aquela aceite pela diferença do génio. A estética da arte, tão transfiguradora como exigente consigo mesma, o auge da perfeição fica longe demais de alcançar.

Mas é vida.

Até aquela que na indiferença de tantas iguais à ela, faz por lutar contra o fim inevitável, mesmo fraca e com medo, arranja forças que nem sabia que tinha, mas luta, mesmo com o caule cada vez mais fino e com a força presa por fios e teimosia. Uns lutam, uns fenecem outros apenas cumprem o propósito...poucos vivem. De cada vez que alguma é arrancada da terra, o choque e a dor avassalam a alma dos que ficam. Não percebe  a razão que ainda, mal aberto o botão, pouco mais teve que alguns momentos ao sol.

Mas há escolhas piores, as que se fazem perante o desentendimento com a sua própria vontade e decidem que  , se o fim é inevitável, se todos nós temos o mesmo desfecho e a vida não nos dá mais em troca, mais vale por si mesmos encurtar o prazo dado.

Desconheço qual será a razão, o que se passa  por dentro e o que lhes tortura tanto para que achem que o momento escolhido é o melhor. E que tenham a coragem de, só porque naquele exacto momento, a vida não lhes dá em troca o esperado...deitar-se em sacrifício na morte pelas próprias mãos... ou vontade.

E que me perdoem a sinceridade, mas quem só sofre de males estéticos e conceptuais e decide tirar a própria vida em nome de uma criatividade genial e mal acondicionada, que não sofre atrozmente de mal nenhum, que não se veja a definhar dia a dia de alguma doença fatal... faz-me vê-lo como um covarde.

Porque entre tantos que, com o corpo frágil e cansado não desistem de lutar, sabem ainda encontrar razões para felicidade e de viver...lutam e vivem. E criam sim, maneira e motivos de dar valor ao tempo que lhes foi concedido neste mundo...
Enquanto alguns  encontram nas adversidades provisórias o motivo maior para desistir, de deixar-se levar pelo ventos e correntezas do mar prematuramente, como um amuo infantil e mimado.

...e olhando para o campo pejado de tantos iguais, mas tão diferentes nas vontades, a minha admiração é cada vez maior por aqueles que lutam contra o vento e as tempestades. Poderão no fim das intemperes restar apenas o caule vazio, sem miolo sem cor... mas deixam sementes de exemplos.

....se a vida é um campo de papoilas ondulantes ao vento primaveril... quem decide viver até ao Inverno das suas vidas lutando, dá valor à cada dia e cada fôlego. Quem se deixa colher ainda com as pétalas viçosas e caule verdejante... não soube acarinhar o presente que lhe coube... nem o dom que lhe foi oferecido. Tudo por egoísmo e medo... e alguma futilidade.



Apareçam

Rakel

Foto: José Freitas


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