Tem daqueles dias em que eu me lembro muito de certas pessoas, daquelas que fazem parte da nossa história pessoal e são dos nossos afectos mais queridos. Já cá não vivem, já passaram para outro lado, mas as conversas cá ficam, as sabedorias feitas de vivências colam-se à nossa memória.
A primeira coisa que perguntei, com a minha inocência juvenil, lá pelos idos de 1980 e tal, depois de me explicarem o que era o Festival da Eurovisão, foi: "...mas então, se é um festival europeu, porque cargas d'água Israel faz parte do grupo a apurar?"
O meu avô, com a sua voz de barítono e um pragmatismo sereno disse-me que "eram politiquices, coisas para alegrarem países e a voltarem a ter visibilidade".
Quase 40 anos depois, a resposta ajusta-se como uma luva; enquanto a estupidez de inaugurar uma embaixada em Jerusalém acontece pela mão do Sr. Laranja, vão fazer festa com um prémio duma música que é a Ode ao clube das desmemoriadas- maria vai com as outras que é o, traduzido, Eu Também. Há aquelas que depois de trinta anos ou mais do ocorrido vem agora super ofendidas gritar que também elas foram ofendidas.
Não é que eu ache que elas não tenham razão, a questão é que passadas décadas vem à luz do público dizer que foram ofendidas quando começam outras a colocar a boca no trombone (salve seja) e a apontar o dedo aos acusados. É no entanto um assunto bicudo, uma vez que há esta dicotomia de "eu posso, tenho poder" e do outro "faço de um tudo para ser actriz ou este é o preço a pagar pela subida ao sucesso". Acredito que hajam muitos inocentes nessa faixa cinzenta entre culpados e vítimas. Mas...
Marilyn Monroe disse ao jovem Rock Hudson, em começo de carreira que, para ser actor, que começasse a acostumar a deitar-se em muitos sofás. E não, não era para fazer uma sesta reparadora depois de um estafante dia de filmagens. Aliás, num antigo documentário, falava-se de uma clínica particular, nesses tempo aureos do cinema, que eram exclusivos das actrizes que engravidavam fora do santo casório e precisavam (deviam) fazer um aborto, já que os contratos e as necessidades ($$$) destas companhias de cinema não podiam ficar a "anahar" enquanto elas faziam o seu percurso pré-natal. Portanto, se formos pegar numa lupa e olhar com olhos de ver e de perto esse mundo de fazer sonhos na tela, a coisa sempre balançava por quem impunha e do outro quem amochava e aceitava o facto de que para fazer carreira e sucesso... eram precisos sacrifícios. E há actores e actrizes que nunca alinharam nessa imposição do sofá e de joelhos e que entraram e saíram de cena. Há mesmo.
Há escolhas que se fazem que podem ser muito duras; por um lado há esse sonho de ser actor, deixar uma pegada funda na sétima arte; por outro a dignidade e o amor próprio. O fiel da balança será sem dúvida aquilo que se preza mais: o sonho ou a dignidade.
Mas voltando aos festivais em pré 13 de Maio...
Sem dúvida que a música presta-se aos dias de hoje, ao movimento em questão e essa maneira de colocar em evidência essa parvalheira de ser Justiceira Social. O ridículo da situação orbita na frase que a menina vencedora (que é assim um cruzamento entre a Cristas e a Bjork) disse no final: viva a diferença e temos que respeitar a diferença. Bonitinho, não é? Pena que essa diferença tenha passado ao lado nos tempos que ela fazia parte da Marinha e dos bombardeamentos na faixa de Gaza, onde muitas crianças morreram... nessa acção militar.
Andam há que tempos estes descendentes de Abraão a bofetada, com tantas similaridades nos usos e costumes, separados por uma religião e uma cidade (além de uma dose excessiva de bairrismo). Mas mesmo assim , apesar de muita boa vontade, estas pequenas diferenças são o suficiente para aliados e guerras, perdas e bocas foleiras e uma paz que não me parece que venha caber neste século. Dizer que o festival presta-se mais do que dar visibilidade aos países e alegrar a malta em tempo de atonia de amor à Pátria.
Por falar em Pátria...
Passou-se a comemoração dos Capitães de Abril, do dia do proletariado que ajuda nas pontes, mas daquelas de fazer fins de semana grandes que a CP aproveita para fazer greve e... percebemos que nada mudou. Sintomaticamente percebe-se que apesar de parecermos estar numa democracia, vivemos noutro tipo de ditadura, com uma repressão e censura sem rosto. E custa-me um bocado em acreditar que os caros leitores não percebam a achega nesta página de notícias onde falam do antigo Sr. 1º que telefonava aos jornalistas e pendia entre a sedução/ameaça velada ou mesmo quando partia para a birra do eu quero. Na altura, só por acaso, aconteceu isto neste pequeno espaço de opinião pessoal. O que não fariam com lugares onde as tiragens e visualizações são superiores à este modesto estaminé. E nesta mesma página de notícias, aparece a notícia em questão e mais abaixo um documentário sobre a repressão da Pide. Pergunto-me se os leitores conseguiram ver esta ironia/ coincidência (e não acredito em coincidências) e na nossa situação. A escolha, esse direito de pensar e decidir está um bocado balançado; agora não há direito de opinião (dizem-me que há, com um determinado preço social) mas sim imposição contínua e homeopática de comportamentos e costumes em que, se não formos na maré acabamos ostracizados.
No entanto, e querendo colocar como termo de comparação a lírica da música vencedora, deixou-vos aos critério dos caros leitores este... monte de qualquer coisa que não tem pés nem cabeça.
Brinquedo
Ri, outch, hey, hm, lá
Ri, outch, hey, hm, lá
Ri, outch, hey, hm, lá
Ri, outch, hey, hm, lá
Ri, outch, hey, hm, lá
Ri, outch, hey, hm, lá
Olha-me, sou um criatura linda
Não me importo com o teu pregador moderno
Sejam bem-vindo meninos, barulho de mais, vou ensinar-lhes
Pám pám pá hu, turrám pám pá hu
Ei, acho que te esqueceste de como jogar
O meu urso de pelúcia está a fugir
A Barbie tem algo a dizer
Ei! O meu rei manda que me deixes em paz
Levo o meu Pikachu para casa
És estúpido, igual ao teu smartphone
Mulher Maravilha, nunca te esqueças
De que és divina e ele está prestes a arrepender-se
É um rapaz có-có-có-có, có-có-có-có
Có-có-có-có, có-có-có-có
Não sou o teu có-có-có-có, có-có-có-có
Não sou o teu brinquedo (o teu brinquedo, não)
Rapaz estúpido (rapaz estúpido)
Agora vou derrubar-te, fazer-te assistir-me
A dançar com as minhas bonecas ao ritmo do córalho
Não sou o teu brinquedo (cululi, cululu)
Nã-nã-nã-não sou boneca
Nã-nã-nã-não sou boneca
(Cululi, cululu) Sinos de casamento a tocar
(Cululi, cululu) Homens do dinheiro bling-bling
Não me importo com a tua grana, rapaz
Pám pám pá hu, turrám pám pá hu
Mulher Maravilha, nunca te esqueças
De que és divina e ele está prestes a arrepender-se
É um rapaz có-có-có-có, có-có-có-có
Có-có-có-có, có-có-có-có
Não sou o teu có-có-có-có, có-có-có-có
Não sou o teu brinquedo (o teu brinquedo, não)
Rapaz estúpido (rapaz estúpido)
Agora vou derrubar-te, fazer-te assistir-me
A dançar com as minhas bonecas ao ritmo do córalho
Não sou o teu brinquedo (o teu brinquedo, não)
Rapaz estúpido (rapaz estúpido)
Agora vou l-l-l-levar-te
C-c-c-comigo agora, rapaz
(Não sou o teu brinquedo)
Rapaz estúpido
Agora vou derrubar-te, fazer-te assistir-me
A dançar com as minhas bonecas ao ritmo do córalho
(Não sou o teu brinquedo) Olha-me, sou uma criatura linda
(Rapaz estúpido) Não me importo com o teu pregador moderno
(Não sou o teu brinquedo) O teu brinquedo, não, o teu brinquedo, não, o teu brinquedo, não, não
Não sou o teu brinquedo, o teu brinquedo, não, o teu brinquedo, não, não
= Lixo puro e simples.
Rakel.
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