Cartazes e Ignorância Inocente



Sou toda à favor da luta pelos ideais; estou a 100% pelo direito de escolha e a sua consequente responsabilização. Não podemos culpar os demais por aquilo que decidimos fazer ou escolhemos abraçar como causa. Certo? Ideias em tenra idade, quando não tem boas bases acabam neste alarmante cartaz empunhado por uma menina, que por certo mal informada, não percebe o significado e a intenção da eutanásia. Por respeito à pouca idade, que provavelmente será menor, e por todos os outros com ela, resolvi "tirar-lhe" o rosto. Mas no fim de contas, ela representa uma enorme fatia daqueles que pouco percebem sobre aquilo que acabou vetado no nosso Parlamento.

"Piquena", a eutanásia não é um instrumento de matar velhinhos; isso o actual e sucessivos desGovernos estão a fazer com as reformas miseráveis, a falta crónica de médicos, os preços exorbitantes dos medicamento para doenças crónicas e, sem esquecer os actuais despejos de moradores nos bairros "IN" da Capital, o crescente descaso das famílias que os jogam e esquecem em lares de terceira idade.

A eutanásia é a chamada "morte por misericórdia"e que está directamente ligada aos casos de doenças sem cura, em que os tratamentos para a dor física (porque a emocional, essa não leva penso rápido que lhe salve) já não resultam. É o fim de linha mais digno. É a última demonstração de compaixão à quem pede uma saída mais rápida deste mundinho das delícias, sem sofrimento. Não é pegar na D. Henriqueta, já nos seus 90 anos lúcidos e, só por que é  velhinha, apagar-lhe o fôlego.

É ao jovem de 30 anos com cancro terminal com semanas inteirinhas e looooongas como o raio, entre dores e alucinações a deixar o mundo de forma medonha e mesquinha e que não vai ao encontro do juramento de "aliviar a dor e sofrimento" dos pacientes. Aliás, minha menina, aconselho vivamente que peças uma visita de estudo num IPO e vás até a ala onde estão essas pessoas. Garanto-te que encontrarás jovens como tu, da idade dos teus pais, ricos, pobres, adeptos de todos os clubes e mais alguns. Isso tudo, no final é igual a zero. O que nos iguala no fim das contas é sempre o mesmo: nascer e morrer.

Vais ouvir gritos e pedidos de ajuda para aliviar o sofrimento; vais ver talvez coisas que te marcarão, como me marcaram à mim há décadas atrás e que ainda cá estão dentro, os mesmos gritos e súplicas. Houve uma senhora que chamava pela filha e morreu nessa mesma tarde.

Entende por favor menina, não te estou a por as culpas desse cartaz; provavelmente quem te demoveu a empunhar essas palavras sem nexo deve saber tanto quanto tu ou talvez ainda menos. Mas movidos por um sentido arcaico e paradoxal religioso ou princípios morais elevados e políticos anacrónicos, acharam por bem dizer-te que eutanásia é matar velhinhos. 

Daqui uns poucos anos, certamente tu começarás a pensar que o teu corpo te pertence e que as escolhas são tuas. Se vais ou não fazer tatuagens, se vais ou não fazer uma plástica para pôr mamocas biónicas ou até mesmo se vais ou não levar uma gravidez avante. Escolhas que tu fazes dentro dos teus critérios e dos quais és soberana. Vai escolher se vais fumar ou não, apanhar bezanas todos os fins de semana ou em época de festivais; se vais abusar nos hambúrgueres ou se tens fúria do açúcar e te acabas em doces. Se vais ter muitos amantes ou nenhuns, casos de uma noite ou de uma vida toda; se diriges como uma louca ou se és uma condutora sem mácula. E isso é o certo, fazer escolhas e saber viver com elas, mesmo que isso signifique que todos os dias estás a te matar (ou não) mais um bocadinho.

Ao mesmo se deveria dar como escolha, e vê se percebe a palavra: ESCOLHA, de viver ou deixar este mundo. Não é uma imposição de "temos muito velhinhos e vamos dar cabo deles". Nem é a saida airosa de problemas existenciais de circunstâncias ou desesperos. Esses fazem as coisas por eles mesmos e, quando apanhados a tempo, tratados.

Menina, gostaria que despegasses um bocado do registo que tens à tua volta e que escolhesses pesquisar sobre estes temas de forma a pegar as opiniões contra e pró. E só depois disso tirar as tuas próprias conclusões. E tem por consideração que, o que hoje pensas ser uma verdade absoluta, daqui uns tempos...percebes que são afirmações momentâneas.

Se queres realmente militar pela pró vida, acho bem que te insurjas contra a poluição desavergonhada dos nossos rios, dos incêndios, das condições muitas vezes inumanas que alguns idosos são tratados. Mas deixa as escolhas mais pessoais, aquelas que sabemos onde nos dói mais, para pensar mais profundamente e isenta de espírito santo de orelha. Pensa por ti. Sê feliz.


Rakel.

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