Previsão



Já li sobre homens a casar com bonecos holográficos ou com uma pizza; também de uma mulher a casar-se com ela mesma e depois meter cornos nela mesma. Já li sobre homem que casa em cerimónia formal com uma cobra, acreditando ser a reencarnação da sua amada esposa falecida. Teve aquele tipo que casou com uma almofada com o formato de uma boneca de anime.

Ele casou com um holograma


Ele casou com uma pizza
A noiva do pirata fantasma
Agora é o caso de uma irlandesa que casou com o fantasma de um pirata ali pelos lados das Caraíbas ou Jamaica...ali na curva, estão a ver?

Depois de ter tido alguns encontros e ter tido alguns relacionamentos pouco satisfatórios, esta senhora decidiu casar com um homem que não vive nesta dimensão e que não lhe chateia a molécula. Casou-se numa cerimónia no meio do mar, com a ajuda de uma médium (há formas extraordinárias de ganhar dinheiro às custas do atrofiamento alheio) que disse o sim pelo digno pirata.

Ok, vamos ser objectivos no assunto: isto de relacionamentos é das coisas mais complicadinhas que há; uma coisa é a procura e outra muito diferente é a oferta. Podemos dizer que do ponto de vista de expectativas as coisas são sempre medidas pela fasquia mais alta; de ambos os lados. E na verdade toda gente tem o seu lado complicado. Não há mar de rosas.

O problema é justamente essa conjunção que se aproxima: Carnaval dia 13 e Dia dos Namorados dia 14 em plena quarta-feira de cinzas. Uma pessoa pega-se me festejos desde a sexta feira anterior, dança até caírem as solas dos sapatos e depois, no dia das cinzas... o começo dos começos da carestia, do jejum e das sextas feiras sem comer carne, do Mea Culpa batido no peito... uma pessoa acha-se sozinha no dia de São Valentim.

Não tendo bola de cristal e nem tendo um número para onde possam ligar para que eu tire o tarot com valor acrescentado, prevejo que essa dura realidade da solterice militante faça mais uma daquelas enchentes de posts pirosos nas redes sociais, posts estes cheios de inconsoláveis corações a espera da sua alma gémea que vem a pé e pela estrada nacional.

A coisa não está fácil, no que uma pessoa começa a perceber os anos a passar e o lado da cama ainda vago traz alguns pensamentos perniciosos e pouco positivistas. Todos os homens são iguais e todas as mulheres são iguais. Com tanto gato escaldado, até as melhores intenções acabam por ficar naquela ilha deserta, sem nada no horizonte e mal dizendo o destino. É nessa hora que, não percebendo bem a razão que os colocam nesse vácuo existencial, recorrem às leitoras de sortes e futuros que, espertas como raposas, sacam o máximo que podem e orientam os consultantes para o próximo desaire.

E cá voltamos ao caso da irlandesa que casou com o fantasma do pirata, o Jack Sparrow da vida dela. Digamos que, de um certo ponto de vista, é o marido ideal: o homem não suja roupa, não fica a chagar a vida de ninguém quando a equipa perde, não fica com o comando na mão e nem a bufar (no sentido flato da palavra) no sofá enquanto vê a bola na TV.  Não ressona nos ouvidos e não reclama a dizer que salada não é comida, nem passa-se da marmita por causa dos sapatos que comprou e que custaram um escândalo. Não faz birra quando é contrariado ou quando não é sistematicamente paparicado.  Há sem dúvidas as desvantagens percebidas: não há cá dormir de conchinha, não há lâmpadas trocadas assim como os pneus trocados; não colabora com as despesas da casa (a menos que o pirata dê o mapa do tesouro) nem vai fazer saídas românticas normais de fim de semana em pousada ou cinema, jantar e por aí vai.

Mas acho que o X da questão para esta senhora é ter o estatuto de casada e, aqui vai, como actriz que nunca ouvi falar, conseguiu chamar a atenção para si e teve os holofotes pelos tais 15 minutos que toda gente corre atrás. Talvez a coisa vá mesmo por aí. Sintomático perceber que, quando alguém anda pelo mó de baixo e não sai nos jornais, revistas ou programas de TV é começar a dizer que foi assediado/a ou que saiu do armário. Lá voltam à ribalta por um bocado e depois voltam à prateleira do esquecimento habitual.

No entanto, aos comuns mortais...enquanto uns se conformam com "antes um mal conhecido que um bem que não se sabe" ou a continuar com dedo podre a escolher qualquer coisa, o que prevalece é essa esperança num futuro enevoado.

...a lotaria não está fácil e já é raro sair o primeiro prémio. Portanto, quando nos sai, é ter a clareza de espírito de mimar e conservar. Senão vai ser uma vida toda em Quarta-Feira de Cinzas. Mas alegrai-vos, pois a inteligência artificial e a robótica, avançando a passos largos como está nestes tempos, logo logo poderão encomendar (e se calhar ficam mais bem servidos do que andar a pagar videntes de meia tigela) o seu par ideal com dois anos de garantia.  :)


Rakel.


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