Depois da razia na cozinha e de ter reduzido para o mínimo a condição da loiça, e nunca me pareceu a vida mais descomplicada nesse aspecto, entrei no resto da casa com ímpetos de minimizar ao que puder a traquitana.
Os quartos estão em vias de ficar ao estilo japonês e ando a ponderar seriamente a possibilidade de substituir as camas pelo futon e colocar tatami. De manhã é enrolar e dobrar tudo e guardar no armário. Sobra espaço e facilita imensamente a limpeza. Aí uma pessoa se pega a perguntar para que raios andamos nós nesta senda de camas com fernicoques e paneleirices só, e é mesmo só, para mostrar depois às visitas o mobiliário requintado e quarto ao estilo Casa Cláudia ou outro tipo de revista de decoração.
Isto, senhoras e senhores é um futon. Um típico quarto asiático,né? |
Chegando numa determinada idade e fartando de rotinas, uma pessoa começa a colocar questões pertinentes ao que significa conforto e qualidade de vida. E foram essas duas pequenas questões que me levaram a ver por outro prisma aquilo que preciso e aquilo que tenho a mais, ou no caso, a menos.
Felizmente, nunca fui muito chegada ao naperom ou ao paninho bordado, mais a jarrinha das flores que condiz com a colecção de anjinhos de porcelana. Ao meu ver, a casa serve para meu conforto, está lá para me servir de local de repouso, reflexão, exercício da preguiça e com tempo para conviver.
Na maior parte dos casos, a vida do cidadão moderno é trabalhar de manhã até ao fim da tarde, chegar em casa, socar roupa na máquina de lavar, fazer o jantar, prometer duas e dar uma ao chão com o aspirador do pó, no caso, dar banho aos pequenos, dar o jantar e deitá-los, lavar a louça, estender a roupa, dar uma olhadela ao que passa na televisão e depois ir dormir. Cinco dias seguidos deste mantra de cedo erguer e tarde deitar até chegar ao fim de semana.
Aí o sábado é o dia de fazer as camas de lavado, dar uma limpeza geral na casa (a merda que é lavar vidros), espanejar os quadros, dar uma limpezas às paredes mais aquele cadeeiro de sala cheio de não me toques e o raio do tapete que ficou com uma mancha do sumo dos catraios, ir às compras para a semana, passar aquela roupa toda que foi sendo estendida e recolhida durante cinco dias. Sobra o domingo que, lamentavelmente, é curto demais. E começa tudo de novo na segunda feira. Isto é vida? Mesmo que as tarefas sejam divididas, mesmo que tenhamos todos os aparelhometros ultra sofisticados... isto é qualidade de vida?
Então, como se faz para ter uma casa em condições, limpa, arrumada e ao mesmo tempo despender o mínimo de tempo e custo para isso? A única solução que encontrei foi mesmo a redução e simplificação da tralha. E é isto que estou a fazer gradualmente. Animada pelo surgimento de espaço, (ena, a casa faz eco) dei-me conta de um outro fenómeno interessante: eu não sinto falta daquilo que me desfiz. E não sei se é pelo facto de ter mais espaço, mas ao mesmo tempo percebo que como não ando aos encontrões em nada e a circular livremente a casa fica mais pacífica. Fica tudo manifestamente mais calmo.
Roupa, outro quesito que merece a nossa atenção; não adianta guardar roupa que já não serve; se assim for e não der para reformar ou reajustar é para doar ou vender. Ok, aquele vestido que só usou uma vez e que custou os olhos da cara mais a ponta do nariz, dá pena de desfazer-se. Mas é um mono que provavelmente não vai voltar a usar e mais vale ganhar uns trocos do que ficar ali ocupando espaço. Atirei para trás das costas o "problema" que não sei quem criou de repetir roupa. Acabou-se a história das 40 T-Shirts e não sei quantas calças. Simplificar é mesmo fácil; e valho o mesmo com roupa diferente todos os dias quanto repetindo as minhas modas. Está limpo e é tudo quanto importa.
Mas isto, de despojamento, pegou embalo.
Já de trinchas e rolos a postos, tintas compradas ao preço da uva mijona (já que a época de pinturas foi lá no meio da Primavera) e agora é mudar a cara da casa. E mesmo com a semana preenchida com as obrigações, com calma, quarto por quarto, sem grandes problemas, dá-se a transformação.
E ando eu aqui nesta revolução existencial simplificadora...e me aparecem cá em casa com um daqueles sacos das compras do mercadinho do Tio Belmiro, cheio de livros de bolso. "Eu sei que gostas de livros e já não os leio, por isso lembrei de trazer-tos." E está ali quase metade dos livros de bolso da RTP, do fim da década de 70 e começo de 80.
Enfim, cá estou eu a ler Allan Poe... e a precisar de me desfazer de um móvel e arranjar estantes.
Foi na mouche, não foi?
Rakel.
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