Rascunhos



Isto de uma pessoa pensar demais acaba por ser tão prejudicial como pensar de menos; evidentemente que com as traulitadas da vida, começamos a ter aquele tique de recuo e começar a pensar e repensar antes de tomar uma atitude ou de fazer uma escolha. Nessas horas, quando uma atitude é tomada ela já foi mil vezes revista e analisada.

"Olá, meu nome é Rakel e perco demasiado tempo a pensar e a analisar"

Se houvesse um grupo de apoio aos que levam demasiado tempo pensando e analisando, estou de certeza lá em todas as reuniões. Já me disseram que penso demais; é a fase que ando mais calada e até arredia, num momento asceta lá na gruta a fazer OOoooommmm e a decidir pela melhor alternativa. E posso garantir que o resultado não será 100% satisfatório, mas é o resultado desse conjunto analisado e ponderado. E tudo isso não é uma questão de indecisão, é a tentativa de um bom resultado.

Foi aí, depois de tantas análises e ponderações exaustivas, que cheguei à conclusão da perda de tempo, do desgaste emocional e principalmente, da incerteza de um resultado satisfatório para todos. Não é possível agradar toda gente, não é uma garantia de sucesso restringir-me ao lado mais racional, desprovido de qualquer emoção e fechando a sete chaves aquilo que por si decide o que quer e gosta. Há esta inevitabilidade de não podermos escolher tudo. Fica sempre um ruído de fundo mesmo quando é decidido não lhe dar tempo de antena.

Quando racionalizamos tudo, também contamos tudo: o tempo (mesurando ao mesmo tempo a realização com a satisfação), os resultados positivos (que em princípio quer dizer que é um sucesso) a satisfação pessoal (que muda conforme os estados de espírito) e achamos que toda essa equação vai dar certo e será um preventivo de problemas.

Na verdade, não controlamos absolutamente NADA; por muitas fórmulas aplicadas ao "problema" (e toda gente vê problema onde não existe) maior se torna. A equação enche o quadro negro da mente, acaba-se o giz e depois ficamos com um zero final que não satisfaz. Sentimos falta, uma imensa falta.

Vou dizer uma coisa que até pode ser considerado um cliché, mas que não deixa de ser verdade; percebi que não vou viver para sempre. Não é algo que possa manipular ou mudar, eu não sei o dia de amanhã, como vou estar e se chego à casa viva. Isso é real e incontornável.

Por isso, e gastando nisso o menor tempo possível a pensar, analisar e comparar, acho que não se perde nada em apostar nas coisas que me interessam. As pessoas que eu gosto, as coisas que eu gosto de fazer, comer, ver e estar. Esta certeza de um fim com data incerta me coloca na vertente mais honesta da vida: dizer o que penso (arcando com as consequências disso), fazer (dentro das minhas possibilidades) aquilo que gosto e aceitar o facto de que o melhor que posso fazer não será de satisfação garantida para toda gente. Não coloco relógio no tempo que gasto; pouco tempo é diferente de nenhum. Nenhum é ausência total e é uma resposta sem palavras que deixa no ar a possibilidade de enfado. Por muito pouco tempo que dê ou receba, se for genuíno é tão válido ou mais ainda que uma vintena de anos de 7/24.

Simplificar o mais possível o que puder fazer, e não, não posso virar uma madre Teresa com a personalidade que tenho. O simplificar não quer dizer que vou deixar de achar mal o que está mal, de reclamar quando algo não está bem e até tenho alguma razão e não vou deixar de perguntar quando preciso perceber. O dizer as coisas que realmente estão cá dentro, desde que sejam sinceras, precisam de apanhar ar e sair, serem ditas e exercitadas.

Quando chegamos a adultos e sabemos que metade do caminho de vida já foi percorrido, que há certezas cá dentro que são sólidas, aquilo que temos que dizer não podem ser gritadas nem sussurradas. Elas só tem que simplesmente serem ditas à quem de direito. Não temos garantias de um retorno 100%  satisfatório. Mas temos a gratificação pessoal de saber que fomos honestos e que verbalizamos. Se os outros aceitem ou não aquilo que damos e temos é algo que ultrapassa a nossa responsabilidade.

As intenções, na maior parte das vezes, são rascunhos que nunca são acabados e  concretizados; o resultado disso é aquele arrependimento de não ter dado vida e ficar na dúvida, se aquilo seria bom ou não.

E se?

Três letras e um sem fim de dúvidas e arrependimentos.


Rakel.



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