Escolhas



Então uma pessoa preocupa-se com a saúde e começa a fazer exercício, pois dizem que inactividade e vida sedentária é o começo de todos os males. Dorival Caymmi, músico e artista plástico brasileiro provou que, comendo comida baiana (saborosa, gordurenta e muito picante) e passando os dias deitado na rede fizeram-no chegar aos 94 anos de idade. Contam-se pelos dedos os atletas que chegaram até essa idade e com alguma qualidade de vida. Mas tudo bem, vamos lá cortar nos carboidratos, comer batata doce (que a gente só comia no Inverno assadas nas brasas) e vamos beber muita água.

Bombar os músculos, zumbar, correr até os bofes caírem no chão, apanhar uma cirrose de água e fazer cruzes canhoto ao inocente croquete  e renegar um belo gelado.  Isso fará de ti um corpo são, sendo a mente um outro assunto...

Depois incutem-nos o programa do sucesso: temos que ser bem sucedidos naquilo que fazemos e precisamos de alcançar uma certa projecção no panorama social. Não te perguntam se és feliz com o que fazes, mas perguntam o quão alto chegaste e quanto ganhas com isso. No que toca ao quanto ganhas, se tiver a capacidade de fazer gala disso com bens materiais, implicitamente intuem que além de bem sucedido, és feliz. Coisas caras fazem uma pessoa feliz, do tipo...aquele café que é só o mais caro do mundo e é cagado por civetas ou elefantes. Não é que os ovos que tanto gosto de comer, fritos e com a gema bem molinha, saiam por um outro orifício mais digno, mas andar a cata dos grãos de café nas poias...é algo que ultrapassa o meu sentido de paciência e de bom senso. O caro é relativo no que toca ao significado que damos.

Há um mundo certinho e cheio de condicionamentos, almejando uma vida longa e proveitosa, que ao mesmo tempo vem tentando deixar-nos envergonhados pela sesta no sofá, da preguiça monumental que nos acolhe nos fins de semana (e mesmo nos visita durante a semana) daquele olhar de mãe reprovadora quando nos acabamos numa fatia de pizza gotejando queijo e nem sei quantos zilhões de calorias acompanhada por uma jola fresquinha ou uma cola (oh meus deuses) borbulhante. Tiveram o desplante de me dizerem quantas calorias tem uma azeitoninha, daquelas que a gente não come só uma. Para que isso tudo?

Pondo assim em paralelo: de um lado os ginasticados, estoicos e viciados em proteicos bebíveis e tão artificiais como tudo que pretende substituir o real, e do outro lado, o que gosta de uma bela soneca, que aprendeu a gostar desse aspecto fofo que lhe calhou nessa criação lenta mas progressiva entre uma bela torrada com azeite e café das velhas e aí nos damos conta que...

...pelo que disse a presidente da Lituânia, os russos tem na mira Lisboa (e por erro táctico e técnico, o resto do país) para lançar uns mísseis e deixar esta terra feita em fanicos. Provavelmente o tio Jerónimo até acha o assunto uma coisa boa, ou então no velho estilo da foice e martelo, remete-se ao silêncio, não vá o Putin achar que ali há renegado.

Quer dizer, há anos que venho escutando de cá e de lá que o Putin anda cheio de vontade de voltar, não só a trazer de volta a velha União Soviética como também alargar o território da mesma, mas nunca pensei que chegasse por estes lados. Mas talvez tenhamos sorte e o míssil acerte numa estátua de um gatarrão com o Marques ou de um jogador de futebol que um dia há-de descansar no panteão, para que o povo se erga e defenda a terra dos egrégios avós. Mas uma coisa é certa:

O tempo é algo de valioso e felizmente, nunca sabemos a hora exacta de nada; o futuro enquanto uma incógnita oferece uma porção de possibilidades que podemos optar no presente. Os estrategas do tempo pensam que alongando as coisas promete um culminar ao estilo fim de ano, apoteótico e cheio de fogo de artifício. Felizmente ser abençoada pela ignorância do que está por vir ou o que me calha no destino, por assim dizer, obriga-me a pensar que cada dia é precioso e que não posso, não devo sequer desperdiçá-lo com coisas que eu sei que não controlo. Um dia de cada vez, em que não fique nada por dizer, nada que me venha arrepender não ter dito ou feito. Não deixar para depois o pedido de desculpa necessário, o assumir que meti o pé na jaca e que há de ser melhor na próxima oportunidade. Nunca penhorar a felicidade por sucesso ou por aquilo que acham que é melhor para mim.

A areia do tempo corre na mesma velocidade  quando eu estou escarrapachada no sofá com um livro em riste ou esteja me desgraçando num cardio fit e me entupindo de batata doce  e água. Enquanto os louquinhos do mundo, que acham que vão viver para sempre, mas na verdade são tão transitórios como qualquer um de nós, estiverem a mandar, pergunto-me se certos sacrifícios e planos jogam ao nosso favor. É que para tudo ficar phodido, basta um desses chalados acordar mal disposto e carregar no botão. E a gente se contendo e querendo esticar uma existência que não depende só de uma contagem de carboidratos e proteínas.

Rakel.



                                                                        

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