Num dos poemas Sufis aparece o relato de um rei (segundo relato era persa) que pede que lhe façam um anel que quando esteja triste o faça sentir-se alegre e o contrário também. Entre ter virado anel de Salomão (último rei hebreu) e depois cada região ter adoptado como seu o conto, ver como tomaram como seu é interessante.
Toda gente quer o seu quinhão de sabedoria, esquecendo no entanto, a verdadeira natureza do conto.
O dito anel tinha inscrito em letras belamente desenhadas "Isto também passará" ; não é como aquela música de 1969 cantada pelo Nelson Ned, mas a questão da impermanência é o ponto chave da lenda.
Queremos, como é natural, que as coisas boas nunca acabem, sejam sentimentos ou sensações, que a boa sorte enfune as nossas velas e que sejamos capazes de viajar pela vida sem tempestades. Mas, e lá vem o tal dos mas... a vida não é feita assim. Há momentos de dúvidas e dolorosas situações; de mudanças drásticas e escolhas intempestivas e difíceis. Erramos e acertamos nas escolhas e caminhos, mas tudo faz parte.
Mudamos constantemente, embora haja quem diga que permaneça tal e qual como sempre foi; acredito que exista uma pequena base sólida da nossa personalidade que fique praticamente imune às mudanças, mas no geral mudamos sim, seja pelas coisas que acontecem connosco seja pela necessidade de encarar que é preciso mudar. As dúvidas são os pontos cruciais das mudanças, e não acho que sejam sempre boas escolhas, mas justificam-se pelo contexto. A dúvida faz-nos pensar, mesmo de cabeça quente e desacelera um pouco uma acção que, mais tarde, pode dar num grande buraco.
Por muitas dúvidas, por muita tristeza e insatisfação que uma determinada fase nos apresente, ela vai passar, não será uma constante. Talvez seja isso que nos leve a ganhar impulso e seguir em frente ultrapassando essa maré de ansiedades e medos.
A razão pela qual a felicidade e as coisas boas tenham que ficar também limitadas pela impermanência é que de outra forma nunca seriam valorizadas. Cada bom momento, cada dia que tenha sido bem aproveitado, sem conflitos com poucas aporrinhações jamais teria valor se fosse uma constante na vida.
No lugar de enxergar apenas coisas muito grandes como termo de comparação de felicidade (muito dinheiro, muita bondade, muita sorte) é melhor ganhar atenção ao detalhe. Pequenas coisas, pequenos grãos que vão sendo coleccionados e que fazem depois um belo conjunto de cores e formas diferentes.
Se calhar, está na hora de eu mesma começar a usar um anel destes, mais não seja como lembrete de que no auge da aporrinhação e dúvida as palavras façam sentido e façam-me respirar fundo em vez de chatear-me. Lembrar que nada é permanente e tudo é provisório.
Rakel.
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