Sala Cheia





A arte tem sido colocada num patamar de avaliação e de conceito um pouco confuso; três gotas e um risco de Miró valeram um movimento que resultou na permanência do acervo aqui no país e lugar de destaque na Serralves. Envolveu personalidades, o governo e ilustres desconhecidos, mas amantes de arte, nessa necessidade de preservar a obra do autor como uma mais valia. Dificilmente poderei dizer que acho toda arte boa ou que me dá algum tipo de emoção. Miró certamente não será o meu escolhido e não por desmérito, mas talvez pela minha visão prosaica da arte.

Tem que me passar alguma coisa, tem que dar um tipo qualquer de emoção que me faça pensar naquilo que o autor da obra queria dizer ou sentia no momento, pois se não me engano, a pintura, dança, escultura e outras formas de arte são um veículo em que o autor coloca as emoções do momento, a sua visão da realidade. E custa-me acreditar que muitas vezes queiram dizer alguma coisa em concreto; custa-me acreditar que a única coisa que pretendem é contar alguma coisa, quando em alguns riscos vejo o traço infantil e confuso de uma criança em idade pré-pré-escolar. Praí com uns 2 anos.

L'Amazone de Joan Miró

Se eu colocasse esta foto da obra de Miró sem legenda passaria muito bem por um dos desenhos dos meus filhos quando tinham dois anos. E me desculpem, mas dentro do surrealismo há sem comparação melhor do que isto.


Os críticos aclamam ou deitam abaixo, consoante dá-lhes na bolha, ou o tamanho da frustração, os artistas emergentes; de facto tenho uma certa desconfiança que mandam aquele palavreado todo no enaltecimento ou abate conforme o TPM ou o carro riscado no estacionamento no dia anterior. E já vi críticos elogiando pinturas feitas por chimpanzés, elefantes e cães, sem saberem quem era o "autor" da obra. E tudo descrito naquela linguagem que fazem-nos parecer muito inteligentes e intelectualizados e por isso, não só importantes como sábios.

Há espectáculos que, muitas vezes me pergunto, se o autor o criou na perspectiva de só ele entender. Esse crivo por onde querem fazer passar os espectadores das salas, tem sido sem dúvida uma das grandes razões, além do preço por vezes maior do que o necessário, que tem esvaziando salas, atirando todo um mundo por detrás dos panos na rua.
Há documentários em estilo "conceito de autor" que não passa nada, não sente-se nada e foram colocados incentivos financeiros e de marketing para isso. Dois críticos aclamam e lá temos uma nova estrela a brilhar em estilo "O Rei Vai Nu".



Vi esta notícia (clique em cima da foto)  e aquilo que me pegou como nota a considerar foi o debate de 15 de Maio sobre "Como criar mais hábito de consumo na Sétima Arte". Falando da ala dos desfalcados financeiramente digo que é uma questão de baixar os preços, logo de caras e os 2,50€ tá muito bom SEMPRE. Mais vale uma sala de cinema cheia em todas as sessões do que meia dúzia de gatos pingados nas sessões de fim de semana. Que apertem no preço das pipocas, dos doces e sumos, estou-me nas tintas, mas baixem os preços se fazem o favor. Invistam no cinema de qualidade europeu, que naquilo que chamo de qualidade, não é cinema com carimbo de intelectualizado.  Deixem-se de tretas... os irmãos Lumière quando abriram os primeiros cinematógrafos não tinham intenções de intelectualizar nada, mas sim deslumbrar e dar divertimento às pessoas.

Só assim por alto: A Vida é Bela, O Mundo de Amelie, O Artista, Cinema Paraíso, O Labirinto de Fauno, Intocáveis (este então já a levar dois remakes americanos em cima) são prova de que há capacidade, desde que haja vontade de fazer bom cinema. Não tenho nada contra Rambos, ou pancadaria Shaolin, e seria uma estupidez minha dizer que não, cresci com essas imagens na minha frente. Só que há sempre mais incentivo para o que vem de Hollywood do que dos produtores europeus. Até aqui está-se a fazer bom cinema, basta ver de cada vez que sai nas nossas salas um bom filme de produção nacional e actores nacionais elas enchem.

Aloooouuuu senhores que pensam em um meio de aumentar o consumo de sétima arte... a malta quer boas histórias, boas produções e bons artistas a trabalharem nisso. E um preço que convide a ser assíduo; tenham em conta a realidade nacional. Cinema é diversão, é escape da realidade, pelo amor do santo pacotinho, uma pessoa quando quer intelectualizar-se arranja outras formas. Lê ensaios, arranja tertúlias de debate onde ficam a trocar e exibir brilhantismo intelectual.

Senhores autores do teatro e dança, as pessoas pagam o bilhete para serem seduzidas pelas histórias e movimentos, não pela vossa brilhante e inacessível forma de ver o mundo ou a crítica que fazem da sociedade. Peneirando tanto o público alvo, com "conceitos de arte" qualquer dia não vão ter onde exibir as suas obras e nem ter o que comer. O público um dia cansa-se de ver o Rei Nu (aquela coisa de que foi ver para parecer que é inteligente e sem gostar ou entender ponta de corno) e deixa de querer dar o ar da sua graça nas salas. Temos tido sucessivamente governos negligentes ou que favorecem uma determinada fatia de autores (e vão saber-se os critérios) no que respeita as artes em geral. Exijam mudanças.

Há bom cinema de animação europeu que luta por sobreviver contra a toda poderosa Disney, mas sem a vontade dos governos em investir (sem favoritismos ou intelectualizações parvas), a coisa não vai melhorar nunca.

Mas nisto do cinema, a resposta é sem dúvida evidente em cada campanha que fazem de baixar os preços. E deixem que as artes sejam aquilo que são: formas de contar coisas, de visões e sentimentos de alguém que só sabe contar assim.


Rakel.




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