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Segundo o dicionário, honestidade é "atributo do que é decente;qualidade do que possui pureza; particularidade do que não se pode reprimir moralmente;castidade". Decência será por ventura uma incerteza de acordo com a consciência e formação de cada pessoa. E honestidade, enquanto não se reprimir moralmente é sem dúvida a mais complicada das definições.

Moral é um código incerto de supostas leis que toda gente aceita e acata como correctas. Em alguns países em que a religião é a lei, bater em mulher é aceite como forma de regular a hierarquia familiar. Na nossa moral é errado, na deles é normal. Então, uma pessoa honesta não tem a vida facilitada, só por ter escolhido ser verdadeiro dentro da sua lógica e código de conduta.

Honestidade não é um exercício fácil, principalmente, quando as pessoas esperam ouvir aquilo que querem. Hoje tive uma conversa interessante sobre isso; uma amigo meu contava sobre o interesse que uma moça tinha por ele... e ele não. Apesar de tudo, apesar saber de caras que era uma conversa nada agradável, ele preferiu ser honesto logo e dizer que não podia retribuir nem o interesse nem os sentimentos. Como é óbvio, apesar de não ser agradável de ouvir, foi honesto e correcto com ela. E nos dias que correm, em que adulação é quase a vírgula da conversação, ser honesto no caráter é quase defeito.

Meio mundo engana outro meio; enquanto uns prometem outros acreditam e depois, lá bem no fundo, percebem que não são mais do que meras palavras, mas aproveitam o momento. O honesto, desgraçadamente, pensa que o seu modo de conduta se reflecte na dos outros e que recebe na mesma moeda. Aquela premissa de que se colhe aquilo que se planta. E é exactamente o oposto que acontece. Serão agricultores de sonhos aos que chamamos de honestos; e talvez por isso, é normal ficarem tremendamente chateados quando percebem que a honestidade não tem retorno.

Exige-se honestidade do político que fez campanha e promessa; exige-se honestidade do par que escolheu para passar até que aquilo tudo que os une se acabe (eu não acredito em amor até que a morte nos separe); exige-se aqueles com quem depositamos a nossa confiança retorne essa exigência. Mas o acto feito na primeira pessoa do singular, as vezes fica meio que na boa vontade e muito pouco na acção propriamente dita. Quantas vezes a moça da caixa se engana no troco à nosso favor e ficam calados? Quando é contra aí a coisa pia mais fino. Quantas vezes não somos capazes de fazer um determinado trabalho (por não sabermos como raios funciona aquele programa, por não termos nem tempo para o nosso próprio trabalho quanto mais...) e dizemos que sim e acabamos entre crises de nervos e um trabalho aquém do esperado?

Quando honestamente nos sentimos descontentes, tristes, chateados, putos da vida e metemos um sorriso no rosto, falso e descolorido, e dizemos que está tudo bem... quando está tudo errado.

O fácil, o que queremos é que a vida seja uma sucessão de uma resposta sempre positiva, sem espinhas e sem senão. Dá-se muito pouco apreço à honestidade e ao que realmente se sente, preferindo entretanto pensar que felicidade ou correcção moral seja um cumprimento de uma promessa ou de uma esperança que não faz feliz ninguém. Mas assume-se que então cumprindo o prometido faz de nós alguém correcto e respeitável, mesmo que seja mentira. Isso não é ser honesto, nem moralmente é aceitável. Mas é justamente isso que egoisticamente perseguem como uma moral sólida. E no fim é de uma desonestidade sórdida e desnecessária.

Toda gente diz que as crianças são cruelmente honestas; um gordo é um gordo e sem eufemismos de "forte" ou "grande". É gordo e fim da parada. Quando pensamos que elogio é aquilo que movimenta o mundo e que seja o real reconhecimento da nossa pessoa ou conduta, será tal e qual como acreditar em unicórnios e pensar nos póneis cor de rosa. Ou no Pai natal.

Esse rapaz com quem conversei sobre honestidade, disse que muitas vezes é chamado de ignorante pelo facto de dizer as coisas que pensa. Agora discorrendo sobre o assunto, apercebo-me que de certa forma é verdade. Ignoramos o convencionalismo do elogio vazio, despropositado e de interesse dirigido à um objectivo final. Ignoramos que seja normal dizer que sim à uma pessoa que apenas por ter um título antes do nome faz dele uma autoridade da moral, conhecimento e bons costumes. Ninguém é perfeito, mas há quem abuse da imperfeição, mas toda gente aceita como facto consumado e que faz parte de uma personalidade selvagem ou forte, como se costuma dizer.

Mentir dá trabalho, exige uma memória prodigiosa para conseguir decorar detalhes e sim, descobre-se facilmente. Talvez para muita gente não tenha grande problema quando isso acontece, mas acho vergonhoso mentir e ser descoberto depois.

Então, por mais desprestigiante que seja, acho mil vezes melhor dizer a verdade do que perder tempo a mentir. Com todos os riscos inerentes ao facto.

Quando ela pergunta se ela está gorda, se gosta dela assim, diga a verdade; se o seu chefe lhe pede a opinião honesta sobre um projecto, seja honesto e diga aquilo que realmente pensa e não faça rasgação de seda só pra agradar ao boss. Se ele te diz que te ama mas tu não, seja honesta. Poderá não ser a pessoa mais popular da cidade, mas vai deitar a cabeça no travesseiro de noite e vai dormir bem. No caso de ser algo terrível demais, mais vale pecar por omissão. Omitir não é mentir, é deixar que as coisas corram pelo tempo e acção próprios sem interferências.

Apareçam

Rakel.


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