Parece ser aceitável e até esperado que as profissões sejam aquelas que envolvam uma licenciatura; um canudo na mão dá (ou pelo menos daria) a garantia de sucesso no mundo. Sucesso, como foi assinalado, com responsabilidade e honestidade, os predicados que fazem de qualquer pessoa um bom cidadão.
Os pais desejam e esforçam-se na difícil arte de educar os filhos, dar ferramentas e possibilidades para que os filhos alcancem o sucesso. O x da questão é realmente a palavra sucesso, de uma maneira geral, não garante felicidade. Do ponto de vista mais básico, TODA gente quer ser feliz, e cada um sabe bem ao que chamar de felicidade.
Não é nada fora do comum ver aqueles que alcançaram o sucesso, a meta que tanto desejaram e trabalharam verem-se depois mergulhados na maior das infelicidades e depressões. Depressão não é exclusivo de quem é infeliz, é a insatisfação apesar de terem mais do que muitos tem. É não saber lidar com as frustrações e os impedimentos da vida. Tem tudo e se sentem nada.
Todos os pais sabem lidar e ter fórmulas para o sucesso, mas poucos ensinam a saber lidar com as limitações e frustrações. Pois os nossos filhos serão sempre os melhores e mesmo que molenguem pelo caminho, empurramos, chagamos o juízo, fazemos marcação férrea, cobramos exigimos...tudo pelo bem deles. É para o bem deles. E por isso muitos acreditam nos "estudos" que dizem que as mães chatas são as que tem filhos mais bem sucedidos. E como disse lá em cima, uma pessoa pode ser bem sucedida na profissão que escolhe, mas na vida privada se sente infeliz.
Talvez porque a pressão familiar fez com que fosse tirar uma das 3 profissões tidas como certas e aceitáveis; daquelas que dá dinheiro e estabilidade: engenheiro, médico e advogado. Engenheiro de qualquer coisa, advogado lutando contra a concorrência e médico... só num grande hospital de capital. Talvez nem fosse isso que queria ser, talvez preferisse uma máquina fotográfica na mão e espaços abertos: ou uma tela em branco e tintas; ou um pedaço de mármore por esculpir ou até alguém que faz pratos deliciosos. Pode até a meta ser uma família, com a honesta e simples profissão de trolha. Cada um sabe aquilo que lhe faz feliz.
Temos uma enchente de licenciados, que honestamente e laboriosamente trabalhou e se esforçou pelo canudo que tem na mão. E agora, vêem-se perante a falta de lugar onde encaixar-se no mundo do trabalho. Mas continuam, mesmo que essa profissão não lhes diga grande coisa; mesmo que seja a realização do sonho de família; mesmo que a palavra insucesso seja um tabu e algo que se tema mais do que a lepra. Não há espaço para falhas, não há lugar e tempo para pensar que tudo o que fez não foi aquilo que sonhou. Sonharam por eles e firmaram-lhes o caminho.
É como aquela história* da senhora professora casada com um mecânico de automóveis. Com um filho onde despejar todas as esperanças e bem sucedidos esforços (e desgraçados são os filhos únicos ou primogénitos) o rapaz tinha na cabeça da mãe "chata" o futuro traçado. Que se danasse o facto do puto até ter jeito e gostar de mecânica, da bagunça da oficina; não o rapaz ia tirar um canudo de Engenheiro e ia ter um futuro garantido. O engraçado é, que aquela professora dizia aos seus alunos que estudassem sim, mas que escolhessem por eles o futuro que lhes fizessem felizes. Diz o roto ao nu, dar conselho que não aplica em casa. O rapaz, depois de tanta chatice e inferno, lá tirou o diploma de Engenheiro mecânico, mas ainda suspira e rouba tempo para ficar na oficina do pai, rebatendo a frustração de não fazer o que realmente o faria feliz. Fez feliz à mãe que diz de boca cheia que o filho é Engenheiro.
Pedem aos miúdos, ainda crianças, que optem pela profissão que, em princípio, é para o resto da vida. Lá pelo 10º ano jogam com as escolhas de área na qual uma criança de 15 anos, que tem hora pra chegar em casa, que não pode conduzir e nem fazer tropa pode, escolher o que vai ser em adulto. É deveras preocupante a pressa de fazer deles já um pré-catalogado, quando nem sequer tem maturidade para isso. Mas já de partida espera-se que por essa altura já esteja capacitado não só para aceitar essa responsabilidade como fazer dela um sucesso. Quando é trabalho de uma vida inteira...
Ensinar a ser responsável? A ser honesto? Uma pessoa com princípios e ideias? Sim concordo plenamente, mas é trabalho de casa que os pais dão, não para serem alcançarem melhor o tal do sucesso, mas é o que toda gente de bem deve de ser. Mas também é trabalho dos pais ensinar a lidarem com as frustrações, e sim, há gente que faz e tem melhor que os nossos filhos sem que isso façam deles menos na equação social. E duvido, realmente ponho em causa, que as mães de todos os políticos nunca tenham ensinado a serem honestos e trabalhadores, com princípios morais e ideais. Até a darem o exemplo e não mentirem a meterem baixas para poderem fazer as limpezas grandes e cobrar horários quando eles, os pais, atrasam-se sempre. As opções que tomam é na base da própria consciência, mas... se forem bem sucedidos, caga-se nisso e tá tudo bem? O sucesso então justifica tudo?
Acho que quando nos sentamos e temos as conversas com os nossos filhos, aquelas de horas a falar de tudo e mais alguma coisa, a pergunta que os pais deveriam ter coragem de fazer é "és feliz?" ou "o que te faria feliz?" E daí ter coragem de encaixar a realidade que ele ou ela não quer ser doutora, mas estilista capilar; treinadora de cães; bombeiro sapador, um pescador de traineira ou até canalizador. E se aquilo que eu acredito (das poucas que agora me restam) é que a nossa felicidade é feita também da felicidade dos que amamos, é deixá-los serem felizes, responsáveis e honestos e a saberem lidar com os problemas e a resolve-los. Ninguém cresce com quem resolve tudo por eles.
E ser feliz, é ter liberdade de escolher, viver isso e se depois quebrar a focinheira, aprender com isso. Mas ter essa oportunidade de viver aquilo que escolhe, mesmo que seja fora do esquema previamente riscado pelo bem deles.
E como filha de uma mãe licenciada em ser chata e com um pai pré-histórico que achou por bem pré- determinar o meu futuro...sei do que falo.
Apareçam
Rakel.
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