Há um costume de todos os pescadores e todos aqueles que vivem do que a terra dá em qualquer lado do mundo; mesmo que apetrechados dos melhores aparelhos e engenhocas, de dispositivos de localização e comunicação, mesmo que tenham acesso às imagens de satélite dizendo como o tempo muda e transforma, todos, sem excepção olham para o céu.
Transcende qualquer explicação lógica e que se perpetua através do tempo, atravessando línguas, cor de pele, formato e cor dos olhos e a idade. Olhar para o céu e tentar encontrar significados que apenas se compreendem duma maneira tão simples e tão visceral, só pode vir de um cromossoma qualquer geneticamente programado, que nos faz levantar os olhos e firmar no horizonte e perceber a linguagem da cor, do cheiro do vento, no modo como os pássaros voam mais baixo ou não. É algo primordial.
Entre as muitas crenças de quem olha para o céu com frequência, há uma que particularmente me pegou o interesse pela singeleza e simplicidade.
No Japão, os pescadores das ilhas, olham sempre para o céu em busca dos sinais de como será o dia de faina. Se o mar vai estar sereno e com brisa leve ou então se vai arrepiar encapelado em fúrias. Dizem os pescadores dessas ilhas, que quando aparece no céu uma nuvem em forma de borboleta, significa que há-de vir tempestade na certa, chuva forte e com vento daqueles que assobia. Mas é o tipo de tormenta que passa tão rápido como se nada fosse, e dizem, o fim dessa tremenda birra do tempo acaba num radioso arco-íris.
Hoje, nesta época confortável de fruta triturada em potinhos, de tangerinas descascadas e gomo a gomo separados em bandejas de esferovite prontas a comer, do alerta de estacionamento, GPS, das maquinas de lavar roupa que analisam as nódoas e o peso para fazer a melhor lavagem ou até do copo de noodles que a cachopada toda adora e faz disso a refeição do dia... olhar para o céu passou a ser desnecessário. Aliás o olhar das pessoas está pregado ao visor do smartphone e ao último like colocado. Na quantidade de comentários ou até mesmo nas reacções de seguidores, mesmo que não seja nas redes sociais. Há uma avidez velada por atenção e reacção, desde que não seja presente e nem pessoal. E a vida continua igual a ela mesma todos os dias e sem surpresas, sejam elas boas ou nem por isso.
Quando uma pessoa precisa na vida de um sinal de mudança, certamente não será assim, olhando nesse pequeno ecrã e desesperando com o fim da bateria, que irá perceber seja o que for.
Se puder pegar como tema de arranque, diria então que, embora muitos de nós não estamos a precisar de saber se há de chover ou não na horta, se vai ter geada negra que vai esturricar as couves, estamos a precisar de prestar mais atenção aos pequenos sinais que a vida vai oferecendo discretamente, mas frequentemente.
Se calhar, deveríamos olhar mais vezes para o céu, ou para os pequenos detalhes que a vida nos oferece e que parece, fazemos questão de evitar enxergar. Por medo, por não ser propriamente aquilo que programamos e esperamos. Tememos, com alguma razão, aquilo que pode defraudar as nossas expectativas mais ambiciosas, ou então, aquilo que pode acabar com o que estamos tão bem e confortavelmente habituados. E na maior parte do tempo pensamos simplesmente, que para nós não há outra alternativa, fechados num beco sem saída, sem sinais, nem leves empurrões ou caminhos a escolher.
Mas... se calhar, quantas vezes no céu não se fez uma nuvem em forma de borboleta avisando que sim, vem aí tempestade, mas a bonança logo chega logo a seguir. Mas ninguém deu por isso, de olhos pregados no chão ou num pequeno ecrã carregadinho de likes.
Olha para cima, se calhar a tua borboleta no céu está ali esperando que dês por isso.
Apareçam
Rakel.
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