Eu gosto de caveiras, é estranho certamente para muita gente este gosto pessoal; está em alguns lenços (ok, tive um lapso durante um certo tempo e caí de amores por um de borboletas), brincos, pendentes, pulseiras, t-shirts, porta moedas e mochila. Não uso tudo ao mesmo tempo, mas gosto de ter uma destas peças comigo. E ainda há de ser a tatuagem no meu corpo, ainda não é não pela falta de coragem, é falta de dinheiro mesmo.
Dirão que é um gosto mórbido sem jeito para alguém que saiu da adolescência e é mãe de filhos; dirão que será um lado iconoclasta mal amanhado e um bocado revanchista tocado pelos vapores etílicos. Mas não é nada disso.
Olhando para uma caveira, não sei se é um homem ou mulher, se era rico ou pobre, violento ou pacifista, justo ou injusto, se era branco, negro, amarelo ou vermelho; tanto quanto não saberia dizer se amou e foi amado, se foi feliz ou profundamente infeliz; se gostava de andar descalço ou tinha tiques obsessivos com as suas coisas. Se seria desprendido ou muito agarrado ao telelé. Se era vegetariano, se tinha preconceitos ou era alguém de mente aberta. Eu não sei, poderia ser qualquer pessoa, um educadinho com cabelo a foda-se que não sai de casa sem se espelhar no lustro dos sapatos; ou daqueles que passa os dedos pelos cabelos e diz que já está pronto a sair. Não sei... só sei que no fim das contas, um dia vou ser assim, uma caveira, que de preferência, está agarrada ao resto do esqueleto. E apenas um patologista forense será capaz de dizer, por meio de estudos dos meus ossos, o meu sexo, a minha altura, o meu peso provável (e espero que sejam simpáticos) o facto de ser caucasiana, embora jamais saberão como era a minha brancura de amido de milho.
Mas nunca hão-de saber a cor que gosto de vestir, as músicas que gosto de ouvir ou a minha bebida preferida. Nunca hão-de saber o que me faz rir, na maior parte das vezes, de mim mesma; ou o que gosto de ter o braço do lado de fora da janela do carro apanhando o vento; ou que me pespego na janela quando há trovoada; que gosto de ver filmes de cerveja preta e jogar conversa fora. Que espicho o olho num rabiosque de gajo bem feito e que fico apalermada com olhos, mãos e voz. Ou que sou um zero a esquerda em questões de dança uma verdadeira dois pés esquerdos. Isso, nenhum médico forense poderá determinar, só se der ao trabalho de ir falando com as pessoas que me conhecem e sabem um pouco de mim.
Por isso, o que me de atraí nesta questão das caveiras e rosas (esqueci de falar que a tatuagem ideal é rosas e caveira), é que a caveira, para mim, representa a igualdade entre os humanos. Debaixo das camadas de pele, gordura e músculos, há este conjunto de ossos que nos iguala. Tanto faz a cor da pele, a religião, o tipo de sangue, se é gay ou hetero, o número de ossos é igual para toda gente. Somos assim por dentro e não será diferente para ninguém este fim.
O que conta então, na minha modesta opinião, são as atitudes. Não me digam coisas que no final se resumem à um zero bem redondo, não adianta parecer uma coisa que não é. Estar ali, nem que seja num rápido "oi, tudo bem" sabe bem; a presença marcada lembrando que não somos esquecidos. O fatinho caro e o relógio catita, os olhos mais claros e a cor de pele no tom que acham melhor... nada disso faz sentido.
Pode ter um conjunto bem arrumado de palavras que batem certinho no alvo, mas depois... diluí-se no tempo e no espaço. Não tem base nem acordo.
Agora a nova moda são os arco-íris por cima das fotos de perfil a declarar que são a favor dos casamentos entre iguais e da igualdade de quem ama os do mesmo sexo. Que eu saiba, aquele grande senhor que tentou revolucionar toda uma sociedade disse: Amai-vos uns aos outros. Ele não disse: meninos só podem amar meninas e meninas só podem amar meninos. Ele abraçou todos, dos escravos ao cobradores de impostos (já nesse tempo as Finanças era odiada e seus cobradores tidos como ímpios); das prostitutas aos sacerdotes e pediu que usassem o amor como bastião da fé, amor é amor e ponto final. Bom, no caso dele as coisas não correram lá muito bem e acabou na cruz. No entanto, devidas as tortuosas maneiras que a religião tem modelar as palavras ao seu bel prazer, as coisas foram sempre vistas de uma forma bastante rígida.
Não vou meter o arco-íris na minha lapela ou em foto de perfil. Há já muito tempo que uso a caveira e rosas para definir aquilo que sempre defini: somos todos iguais por dentro e por isso tanto se me dá ou não quem escolhem amar. Mas amem, tenham essa coragem de olhar nos olhos e dizer, afirmar sem ser por obrigação ou hábito que amam. Amem por gestos e atitudes, decidam ter isso com frontalidade. Mas tenham em mente uma coisa: aquilo que decidem fazer entre os lençóis consensualmente, as suas preferências sexuais não é o TODO que o define. E nem deveria de ter que ser necessário justificar à mais ninguém o que sente e o que deseja... a não ser à pessoa que se ama. O resto... quem não aceita que meta uma rolha e se aguente.
Apareçam
Rakel.
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