Havia um perfume no final da década de 70, começo da de 80, que tinha este nome, Tabu. Em questões aromáticas foi das maiores agressões olfactivas que já tive memória, das velhinhas amantes da naftalina e Tabu em cima. Mas não é esse o motivo que me leva a escrevinhar algumas ideias. Nem será um dos meus filmes preferidos, Gohatto, mais conhecido como Tabu, de Nagisa Oshima, tendo o Takeshi Kitano no elenco, o Chuck Norris lá do país do sol nascente.
Segundo consta, tabu é um tipo de idolatria em que não se questiona nada, não se toca em nada do que foi intitulado sagrado, não respire, nem rale perto. Não se pode questionar os defeitos, não se pode questionar a legitimidade dos actos, nem sequer pode-se pensar em algo caricato, pois tanta santidade, num mortal (que também arrota, coça o rabo e dá os seus peidos), não pode ser colocado em causa. Pior ainda é idolatrar um falecido à quem se jogou nas costas todas as façanhas e nenhum defeito e tornam-no num altíssimo iluminado-enviado- divino-filho de deus (e não somos todos?) protegido pelo dogma e tabu.
Pensando bem no assunto, acho que desde que o ser humano conseguiu andar sobre os pés e começou a desenhar nas cavernas as caçadas, os animais, desde aí deve ter tido sempre a tentação de caricaturar a si mesmo. Saber rir das desgraças, a piadinha, o sentido de humor, sempre foi a melhor arma para fazer descer do pedestal onde se colocam os meros mortais armados em intocáveis.
Pergunto-me se alguém se lembra do José Vilhena, embora só tenha conhecido as suas obras na década de 80, um tipo que usava do desenho e da escrita para caricaturar a sociedade, a política e a religião, se hoje fosse mais prolífero, não estaria agora a ser vaiado pelo facto de brincar como sempre fez. Na altura, me contaram, que de cada vez que os livros dele chegavam aos quiosques, eram quase sempre confiscados pelos agentes da PIDE. Mas consegui ler a série O Filho da Mãe, e dei uma olha nas caricaturas do tempo do Spínola.
Teatro de Revista, tanto quanto sei, é uma forma humorada de caricaturar tanto políticos como o nosso Jet Set híbrido. Pergunto-me, quantos de vocês que tem Face não colocaram "RELVAS, VAI ESTUDAR!" ou então aqueles cartoons e montagens do Pedrito Coelho mais o Portas? Quantas anedotas foram contadas e repassadas de quando o Guterres não soube fazer uma conta de cabeça?
Quem não se divertiu com o Contra Informação, os bonecos que viraram uns anos o panorama político, jornalístico e futebolístico? Seriam agora censurados sem dó nem piedade? Será mau da minha parte, fazer pouco com todos os totós que vão de propósito tirar fotos em frente da prisão onde está o Sócrates? Quer dizer... tem algo parecido no bater no ceguinho ou sentir-se desforrado, como se fosse ele, o Sócrates, o único manchado neste desGoverno político nacional. O Resto, nem se comenta, não vá lá cair um tabu ou o santo do altar... ganda nóia...
Eis que se não quando, anda toda gente praí armada em moralista, vamos respeitar os intocáveis, os protegidos do tabu, pois isto é tudo sério e não devemos dizer nada, expressar nada e muito menos ainda beliscar os mortais engajados na imagem de semi-deus. O Papa Francisco, que dantes era apoiante do regime ditatorial argentino, agora bem apoiado num molde de marketing e muito popular, diz que não podemos brincar com a religião... Não podemos brincar com Bispos que enriquecem como reis, nem com freiras que ganham concursos de talentos. Nop, tudo caladito, tudo muito calminho, não respirem, não pensem sequer, pois até pensar pode ser pecado, nem digam nada contra. Só a favor.
Neste momento, um bolguista está preso e condenado a 10 anos de prisão e mil chicotadas por ter feito um post jocoso, com sentido de humor. Não vejo praí ninguém a assumir-se como "Eu Sou Raif", nem a fazer passeatas e minutos de silêncio. Muitos que escrevem nos blogues as suas opiniões já tiveram as pernas cortadas. Chegou-se a pensar, lá na terra brasilis, numa lei limitando os bloguistas e o conteúdo das suas opiniões. Não muito longe disso ficou a tal lei americana, a SOPA, a que pretendia, em nome da segurança nacional, limitar, vigiar e impedir que a informação circulasse livremente, embora a Internet tenha sido pensada nesse moldes. Coincidiu no momento que saíam cá pra fora a forma como os presos eram tratados na prisão de Guantanamo.
Pergunto-me se o sentido de humor, a capacidade de rir de si mesmo, perdeu-se algures entre a falta de inteligência e a ignorância. Será que o panorama intelectual vai ter que mudar, que vamos ter que andar aqui todos a fingir que vivemos dentro da Democracia, que a liberdade de expressão ditada nos direitos humanos e na constituição, vem no rodapé com aquelas letrinhas pequeninas dos seguros?
Deixo aqui o link da Amnistia Internacional com uma recolha de assinaturas para a petição para a libertação do Raif, o bloguista que toda gente viu no telejornal a levar umas chicotadas. Se puderam apoiar o Charlie, apoiem também aqueles que estão condicionados aos humores dos intocáveis. Fica à vossa escolha, escrevam ou não, leiam ou não, concordem ou não. Mas não esqueçam o direito fundamental e assumido de liberdade de expressão. Senão, pra que raios foi o 25 de Abril e toda essa garganta de "o povo livre"?
Apareçam
Rakel.
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