Tempestade




Sente-se o ar tenso, carregado e parado, num céu escuro que esconde os astros da noite, na antecipação do inevitável descarregar de fúrias e tormentas. Mas há aquele momento, sem contagem medida do relógio, que esperamos que o vento surja a anunciar o começo da tempestade.

O vento enfurecido, carregado do calor e do frio , corre e anuncia a sua revolta, a sua insensatez de quem perdeu a cabeça e o Norte e só precisa gritar em fúria as suas razões, raivas e tristezas. As folhas secas e largadas no chão fogem ruidosas e espavoridas desse vento selvagem e imparável. Tanto se enfurece e empurra tudo à frente, que se torna mais escura a noite, pesada, farta, cansada de tantas tensões e diferenças. O quente do dia, o frio da noite, as diferenças que cabem tão bem, onde não há certo ou errado, nem o melhor ou pior momento, apenas são o que são, sem justificativas ou explicações.

Dentre a revolta do vento, a tensão carregada das nuvens, chega o momento que, tanta energia, tantas coisas acumuladas se rasgam num fio de luz que dardeja o céu e estala num ribombar como um murro na mesa.  É a alma a sentir o insustentável, e outro fio a rasgar em luz azul no céu e outro murro na mesa... e a raiva, a descrença de ser confrontado com o infortúnio, e de toda esta ironia que faz a vida, se desfaz numa cortina de água, num choro convulsivo e abundante, com fios de luz e vento revolto.

E a noite se veste assim, de manto escuro, com perfume do vento furioso, com fios de luz ao pescoço e de chuva desconsolada e abundante.



Quando o tempo nos dá a sabedoria de que o inevitável é parte da equação, quando a cabeça assim o compreende, mas o coração ignora, as tempestades acontecem. Duvidamos de tudo aquilo que costumávamos acreditar e começamos a pensar... demais, começamos a fazer um futuro que ainda não existe, e deixamos de acreditar no que somos, do que é importante.

Se agora é noite escura a desfazer-se em ventos e tempestades... há de chegar o momento em que a chuva acaba, o vento se desfaz em brisa carregada de odores de verde e terra. No lugar dos fio de luz nervosos que gritavam e esmurravam o ar, ficam as luzes serenas das estrelas e a Lua, eterna lamparina que vela a noite.

Entre a tempestade e a bonança vivemos nós um bocadinho. Só não percebe esse movimento de fúrias e paz, os que se guardam das paixões, do sentir e do abrir a mente para o que há a volta. E de tão fechados e tão protegidos se colocam, que no mínimo deslize de tocar no mundo das tempestades e calmarias... vêem-se aflitos e cheios de medo. E há beleza nessa brutalidade que é a força da natureza.

...e chega a hora, que há de deixar que a tempestade aconteça, pois não se guardam facilmente forças naturais, normais e necessárias. Quanto mais estancadas... maior proporção tomam... e é deixar que se rasgue o céu em luz, que o vento empurre as folhas mortas e que a chuva lave o que restou de tudo...





Rakel


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