O Museu do Brinquedo em Sintra vai fechar, assim, na maior paz e desapego possível. Pensando bem, sendo algo que é apenas cultural, algo que serve para conservar uma evolução social, não tem qualquer tipo de valor neste país de futebóis, taças manhosas e cachecóis embebidos em naftalina. Até o facto de ser criança, diante destas bruscas mudanças tecnológicas, mudou de rosto.
Outro dia vi com uma certa nostalgia uma miudinha de uns 3 anos a empurrar um carrinho de bebé com boneco lá dentro pela rua. Hoje já não vemos muito por aí uma menina com a boneca ao colo em jeito de mãe em progresso. Mal e mal, ainda em alguns recreios de escolas que não fazem esta restrição, vemos uns piões de madeira a girar. Mas sempre aparece um puto ranhoso qualquer, que de peito estufado que mostra o BlayBade de plástico made in China e a dizer que é melhor. Isso quando ainda há a sorte de não abanarem o telelé com jogo ou o tablet que o padrinho deu com um jogo "muita giro".
Fiz os posts Meninice por isso mesmo, ser criança, já não é o que era. Há um claro retrocesso nisso de ser criança. Embora pintem a Idade Média como a parte da história em que os pais pouco ou nada ligavam aos filhos, não será bem assim. Muitos factores jogavam para que o papel da criança fosse bastante controverso. A esperança de vida rondando entre os 35/45 anos de idade, fazia com que começar a trabalhar aos 4 anos de idade não fosse nada fora do comum. Começava-se cedo a vida responsável e de muitas vezes criar os irmãos órfãos. Nem é preciso recuar tanto no tempo: a Revolução Industrial foi a maior máquina de fazer crianças trabalharem, e uma realidade clara das obrigações sociais que as classes exigiam. Se por um lado os pouco afortunados tinham que trabalhar, os das classes mais abonadas tinham que assumir os compromissos familiares muito cedo.
Mudou muito a partir dos finais da década de 20 do século XX, ser criança e ter direitos foi então algo que começou-se a estudar, orientar e promulgar. Desde esse tempo, vários progressos fizeram-se sem dúvida nenhuma. Fim de uma Primeira Grande Guerra, terá sido um impulsionador desta viragem. Depois da Segunda Grande Guerra, lá pelos idos de 1959 foi melhorada a Declaração dos Direitos da Criança. Pelo jeito, são precisas Grandes Guerras Mundiais para que o papel das crianças seja revisto e melhorado...
Em todo caso, na Declaração Universal dos direitos da Criança não vem o ponto mais importante: Toda criança tem o direito de ter pais capazes e devidamente autorizados para isso.
Qualquer pulha ou desvairada mental pode ser mãe ou pai de uma criança. Mas...
Se quiser conduzir um carro, tem que tirar uma licença. Se quiser ser professor, tem que tirar uma Licenciatura (que é uma Licença para exercer tal cargo) se quiser ser caçador, tem que ter uma licença para ter uma arma de caça... pra tudo há licença, menos para ter filhos. E enquanto muitos são pais por desejo de família, porque gostam de crianças... outros fazem por composição de "uma família tradicional". Não brincam, não falam com os filhos e deixam em mãos alheias a tarefa de os educar. O sentimento de culpa de horas e horas a trabalhar para dar "um lar confortável", resulta no Tablet com jogos e uma criança abestada e babando em frente dessa telinha, deixando os pais com a paz necessária e sem passar pela fase intrigante das perguntas por tudo e por nada.
Temos então os miúdos com 6 anos com telemóvel e chave de casa, que já sabem aquecer a comida no microondas e que depois ficam entretidos numa telinha de 7 polegadas.
Bonecas, piões, jogo do elástico, os cromos já nem serão peças de museu... porque brincar a sério e com outras crianças vai passar a ser um hábito em queda livre e sem museu para recordar, que brincar foi um direito. Já não se brinca, nem as crianças, e nem os adultos... e realmente é uma pena.
* Há coisas do caneco... depois de fechar o post e publicá-lo dei uma espreitadela pelos jornais online que ainda não tinha lido... e dou de caras com este senhor artista, com a opinião a respeitar como manda a boa liberdade de expressão, a dizer que levar crianças ao museu é um erro por não serem ainda humanas para entender complexidades plásticas... voltemos ao tempo da pedra lascada e à mentalidade cavernícola de que as crianças são um saco vazio. Provavelmente há de ser uma opinião como daquela baixinha, que não tendo já visibilidade (não por ser baixinha) volta-se contra os colegas que fazem pela vida em outros trabalhos.
Apareçam
Rakel.
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