A Carta da Morte e As Minhas Divagações Habituais




Enquanto meio mundo se descabela por causa do mundial, dos golos sofridos e pela derrota da sua selecção... o mundo continua a girar, os dias seguem depois de cada noite, uns nascem, outros morrem, criam e destroem coisas. A vida continua.

Dentro desse ponto de vista, o equilíbrio é o que faz com que tudo aconteça, uma regra básica da existência, no conceito prático e racional, assim como o espiritual e da fé.
Então, um belo dia, uma pessoa pára um bocado, começa a pensar com os seus botões, separa cada episódio da vida... e nada faz sentido. Não faz sentido uma data de escolhas, não faz sentido investimentos interiores, nem faz sentido ideais. O equilíbrio não existe, e o que pende na balança é justamente o contrário de tudo aquilo que se acredita. A fé fica abalada, o raciocínio depura cada pedaço dos factos, a descrença sobe em flecha e instala-se a crise existencial.

Chegar nesta idade e ter uma crise existencial poderá ser um cliché, mas não acontece por acaso, nem por mera falta do que fazer. Uma vida em contra-relógio, correria total, lá vai o tempo de ler quatro livros por semana, estar a par do que se passa em música e cinema. Tempo fugindo pelo ralo, os amigos que pouco vejo, os almoços que falhei, nem uma bejeca a preguiçar numa esplanada fazem parte do meu actual modo de vida. Vida pessoal penhorada e mal amanhada.

Aí e pensei: sou eu ou é o mundo? O mundo é que anda desequilibrado ou sou eu que pendi só para um lado?  O tal do meio termo necessário... e eu tapada como uma porta, não dei-me conta dos sinais mais que evidentes.

No campo espiritual (podem torcer o nariz que eu não me ralo nada) quando dormimos o nosso espírito liberta-se da casca e vai dar umas voltas. Visita entes queridos vivos e desencarnados, ajudam em momentos concretos pessoas que precisam, andam por aí, a viajar no tempo e espaço. Quando acordamos, muitas vezes os sonhos parem loucos, saídos de um filme sueco sem legendas ou apenas fragmentos desconexos. Segundo consta, é porque o corpo físico não entende o que ocorreu com as vivências do plano espiritual, ficando apenas resíduos. Por outro lado, quem abre-se para esse lado, começa ter a capacidade de não só lembrar, como também de ter sonhos cada vez mais vívidos.

Deixei de lembrar dos sonhos há uns anos, deito-me e levanto sem filme, nem pipoca. De certa maneira distanciei-me bastante do meu lado espiritual e fujo um bocado desse assunto todo. Exagerei na dose de tanto lado espiritual e assim, a ficha foi puxa e fiquei um bom tempo em off.

Admito, eu sou um bocado, ou talvez muito, do estilo tudo ou nada. Quando entro, entro de corpo e alma e doseio muito mal as coisas... sou péssima gestora de afectos. O que quer dizer que quando gosto é para valer, e dedico 100% do meu tempo naquilo que me apaixona. E quando não gosto... pura e simplesmente deixa de existir e anulo da minha vida. Neste caso, troquei um afecto por outro, investi na vida prática totalmente, o trabalho virou o umbigo do meu universo. Pensava ter tudo controlado, as coisas encaminhadas, planos delineados e tudo girando 99% em vida prática.

No 1% que sobrou houve espaço para uma cervejinha e dois dedos de conversa com amiga de sempre e a falar das banalidades normais: filhos, amigos e, lógico, gajos. Nessa conversinha informal, de risadas e casos insólitos, acabei por contar um sonho (yupiii, depois de anos lembrei de um) que tinha tido na véspera. Vi-me com um baralho nas mãos e ia virando as cartas em jeito de leitura do futuro... todas que virava tinham a face em branco. A última carta, a única com face, era uma carta do Tarot, a da Morte. E eu, feita cretina, arrematei a descrição com um: "Mas que raio quererá isto dizer?" como se a minha amiga soubesse dar-me a resposta...

Resumindo: caiu-me um bomba no colo, nada que eu poderia controlar, nada que fazia parte das minhas opções, um percurso que eu não escolhi, por isso as cartas viradas não tinham face. A última, sendo a da Morte, não quer dizer que eu vou morrer cheia de maleitas, significa uma mudança radical, uma verdadeira virada na vida.

Eu sou optimista, mas uma do estilo realista, o que quer dizer que sei bem como a vida pode ser uma cabra vestida de Prada. Parece tudo bem, parece maravilha, oba oba, vamos ter mudanças... mas nem sempre é essa maravilha. E quando começam a me dizer, tem calma Rakel... aí é que eu não fico calma. E quando ficamos nas mãos de eunucos... o cenário apresenta-se mais negro ainda. Mas vamos lá, se há cenário negro, que se acenda uma luz, certo? Se sou eu a que faz má gestão de equilíbrios, vamos lá então acreditar que há algum equilíbrio neste universo e que as coisas fiquem no lugar certo. Luz e escuridão em partes iguais.

Moral da história: é melhor começar a fazer uma gerência mais saudável da vida, encontrar o meio termo não é fácil quando as contas são prioridades. Mas por outro lado, a negligência com a vida pessoal não é assunto para menosprezar. E abrir a pestana, pois nada é certo, nada é imutável e tudo vira na hora que estamos distraídos. Valeu a lição.

Para quem não entendeu o post, não se amofine, há situações que nem dá pra explicar de outra forma que não seja esta. E no mais, consigo melhor encaixar as coisas quando escrevo, por isso...


Apareçam

Rakel.

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