Ando aqui a pensar um bocado num assunto, daqueles que não são tidos como importantes demais na vida actual, esta em que nos debatemos em tentar sobreviver com as escolhas que fazem por nós, mas pronto, pensei nisto. Por outro lado, justamente nestas horas em que nos sentimos aflitos, em que o mundo conspira contra algum equilíbrio, é nestas horas que se procuram os símbolos de luta.
Não percebo lá muito bem, e isso se deve à minha formação interior, do culto dos mortos. No meu entender, o corpo físico não passa de uma casca, um vaso onde se carrega a alma por um determinado período de tempo. Nesse tempo, ou temos a coragem de fazer algo bom, construtivo e interessante, ou então decidimos apenas vagar por uns tempos a fazer o que nos pedem ou julgamos ser o que esperam de nos.
As "discussões" acaloradas sobre quem deveria estar ou não no Panteão, ao lado da Amália e de outros notáveis, seja mais importante do que o conhecimento da pessoa que foi. Os heróis nacionais, repousando ou não os ossos num local maior e com um nome pomposo, não irão passar às novas gerações a sua história de vida, nem a sua importância, se os que os conheceram deixarem de passar ou de relegarem ao plano corriqueiro, as suas façanhas. É ver a vergonha que é perguntar aos actuais universitários o que foi o 25 de Abril, ou quem foram os presidentes no pós monarquia e começo da república.
Assistimos de camarote as trocas e baldrocas os nomes de autores e livros nacionais, é ver o enfado com que se estuda Eça ou Sttau Monteiro: estuda-se a obra na base do empinanço para a nota de final de período. O quem foi o autor e a época que viveu, passa ao lado na aula dada em estilo monocórdico, em modo de despejo-que-o-programa-é- grande- demais, matando assim o estímulo de leitura. Mas façamos estátuas e rotundas, coloquemos seus ossos em Panteão com honras de estado como se assim, dessa forma, tudo ficasse resolvido.
Congelados em bronze, pedra mármore ou em urna trabalhada e lacrada, esperam que se perpetuem na memória de um povo esquecido deles próprios, do seu orgulho, da sua nacionalidade e da sua história. Se o povo se esquece do momento, do lugar e da sua própria história, tanto faz o lugar onde repousam os ossos ou finca-se o monumento. Passa apenas a ser um ponto de referência de direccionamento : "vire a esquerda lá na estátua do bigodudo."
Para mim, que acredito apenas na forma provisória em que vamos de vida em vida, tanto faz como fez o local onde se coloca um monumento, onde fica um notável. Acho muito mais importante falar, despertar a curiosidade das próximas gerações do que foram, que fizeram e que mudou no nosso mundo cada uma destas pessoas. O colocar em placas de nome de ruas, nome de pontes, escolas ou jardins, não confere a mesma importância do que SABER quem realmente foram os que mudaram, mesmo que só um pouco, a face da nossa sociedade. Tudo, defeitos e virtudes, ninguém é infalível...
Os monumentos, passando as vontades e os poderes, erguem-se e derrubam-se; por outro lado, a verdadeira natureza do trabalho feito pelo homenageado deveria ser o mais importante... mas não é assim que acontece.
Já viram bem, quando há cenas de pancadaria entre padres ortodoxos e católicos na limpeza do santo sepulcro? É essa a mensagem passada por Jesus? O local é mais importante que os ensinamentos? Ou tudo não passa de um cobertor e uma chucha para apaziguar os nossos medos?
Debates por quem vai ou não para o Panteão ou onde se coloca a estátua de um capitãode Abril... que morreu doente e esquecido quando vivo. Francamente...
São discussões...tão fúteis como decidir a roupa nova do rei quando toda gente anda nua.
Deixo então uma frase do escritor Luís Sttau Monteiro que ilustra aquilo que ele pensava, mais importante que qualquer estátua em praça pública:
"A única coisa sagrada é ser livre como o vento..."
Apareçam
Rakel.
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