Comme Si, Comme Ça...

Os escoceses, esse povo danado e combativo, andam preocupados com o sumiço da Nessie durante o ano de 2013. Pelo que parece, o mítico ser aquático que fez do lago Ness um dos pontos turísticos mais emblemáticos das terras altas deu uma de Greta Garbo e foi num "I Want To Be Alone" e sumiu. Talvez a Nessie tenha sentido a necessidade de tirar um tempinho de férias ou então decidiu que o mundo já está peculiar quanto baste e que ela, tadinha, já é assunto fora de moda.

Enquanto a comunidade científica não vê veracidade na existência pacífica desse apelidado "monstro", várias expedições foram feitas, muitos radares rastrearam as água turvas do dito lago e ficamos mais ou menos na mesma: entre o mito e a realidade. Acho piada aos mitos, acho que vez por outra é preciso acreditar em algo que não seja tão preto e branco na nossa já bem dura realidade. Eu ainda uso a alegoria do Pai Natal, nem que seja para ir largando umas deixas de que vou pedir à ele um ou outro pedacinho de futilidade que a minha carteira anoréctica não alcança. Mas a deixa fica em águas de bacalhau, pois nem o velho gordo me escuta e nem quem me ouve se comove. Caso para dizer que fico sempre na vontade de ter umas botas New Rock, mas ficando sempre por aí mesmo. Querendo.

A nossa mítica fundamental sempre coube o herói, a vítima e o monstro, é assim desde que se contam as Sagas lá do Norte, até a Zeus com o seu raio que parte tudo. Saltando para o lado andino temos Quetzalcóatl (um raio de nome que só me deu para conhecer por causa do Final Fantasy VIII) a serpente emplumada com uma forte conotação espiritual... mas serpente emplumada não existe pois não? Mito raiando a realidade seja na dualidade de Vixnu e Shiva (destruição e construção) isso assim explicava alegoricamente a realidade conhecida. Bom, sendo assim, cada passo dado na civilização vamos nos distanciando do mito? Não me parece, apenas o conteúdo torna-se diferente nas gerações que vão passando. Bloody Mary, Candy Man, Jack Estripador, Bigfoot são uma passagem de épocas mais ingénuas para outras mais realistas. Mais sangrentas, diga-se de passagem.

Junto dos mitos há uma clara conjugação aos rituais de passagem, o largar da infância e entrada abrupta na vida adulta. Ritos, mitos e passagens são comuns em todas as civilizações, alguns desses ritos de passagem ainda perduram nos nossos dias, e o caso mais flagrante, que até agora já deu pano para mangas... é a praxe. Se me permitem, se me dão licença, acho que a praxe é uma forma de treinar os futuros cidadãos para aceitarem em nome de uma coesão sobrenatural (pois ninguém sabe bem para quê dessa coesão) toda a merda que lhe cair em cima.

Há uma confusão brutal em criar uma personalidade forte diante de uma contrariedade com sobreviver a uma experiência degradante e perigosa. Deve haver muito ego murcho que precise dessa nica de poder para sentir-se mais e melhor no mundo. A chantagem muitas vezes feita em não poder usar o fato académico se não fizer praxe, resume em tudo que se passa em 4 anos de universidade nesse ritual mítico de iniciação?Deve ser por isso que há gente já com idade para chegar perto da reforma com inúmeras matrículas, um mamífero de 42 anos no pêlo e ainda posa de Dux como profissão.

Nem é a primeira vez que há vítimas desse ritual desnecessário, a memória colectiva é que vai esquecendo as queixas de brutalidade, uma ou outra morte que fica sem solução... até que um grupo inteiro acaba mal e aí começam a questionar os usos e costumes académicos. Talvez a maior coesão neste facto se deve ao silêncio e uma certa cegueira selectiva da parte das universidades e associações de estudantes. Não se fala do assunto... meio em jeito do Skull and Bones, uma sociedade secreta estudantil americana, com raízes no século XIX e que segundo consta, deu como cria o George Bush Júnior, essa sumidade intelectual. Há tanta gente preocupada com a Maçonaria, da abertura de uma Juventude Maçónica , quando há décadas os estudantes universitários cultivam modos e maneiras de ser pouco claras. São acusações que faço? Não, apenas um apanhado geral do que se fala, ou do pouco que se fala e desta forma de ser mais forte na vida adulta. Uma comparação, se calhar, um bocado rebuscada destas cenas dos mitos, rituais e tudo aquilo que se pretende que fique distante do incivilizado.

E é nesse mais ou menos que vejo a vida, onde somente os personagens dos mitos, entre vilões e heróis mudam. Nem sempre vejo a nossa actual civilização mais perto de uma justiça ou de uma certa coerência. E continuamos a  temer que o céu caia nas nossas cabeças, rezando para que Toutatis passe longe do nosso planeta (é mesmo um nome de um calhau a deriva no espaço) ao mesmo tempo que colocamos miudagem para se formar em copofonia e em figuras tristes. Sou 100% a favor da socialização... mas não pendente de andar a arriscar a vida nisso, ou com base na humilhação.

E pensem bem, depois de passar pela praxe, investir tempo, dinheiro e projectos, formar-se e entrar na vida adulta e poderá acabar... na rua. Não me parece que a praxe seja assim uma forma de tornar-nos forte, mas sim complacentes.

Apareçam

Rakel.