Nos Doces Braços das Valkirias




Gostamos de nos definir como racionais, abertos a novas ideias e movimentos culturais, na verdade, guardamos em nós aquele pedacinho neandertal que se assusta e maravilha-se com o inexplicável.

Explicar a morte e a possibilidade de uma vida após a morte é algo de altamente delicado como de absolutamente necessário. Os cientistas precisam de provas baseadas em quantidades, estatísticas, fórmulas e evidencias mensuráveis. Não é um assunto fácil, mexe com tudo aquilo que durante uma vida toda negou-se, temeu-se e colocou-se longe da nossa realidade, pois o mundo é dos vivos, certo? Quem sabe?... Melhor aceita-se entende-se o que um cientista propaga, do que séculos de experiências de leigos e perfeitos desconhecidos. Mas a história e as marcas deixadas antes deste mundo perfeito e tecnologicamente dependente costuma temer.

Desde tempos que se perdem longe na memória, a humanidade procurou explicar da melhor forma o mundo que ribombava em trovões e relâmpagos, a fúria dos ventos e o calor calcinante do sol. Viam como depois de cada grande fogo, de cada erupção vulcânica que modificava a face dos continentes... a vida renascia verdejante. Talvez por isso mesmo, quando algum companheiro ou familiar morria, cultuavam o corpo, deitam-no como que adormecido, junto com os seus pertences. Ainda hoje arqueólogos encontram esses túmulos pré-históricos recheados com flores, objectos de caça e restos de peles. Do Cáucaso à Península Ibérica, os dolmens são o testemunho tumular dos hábitos pos-morte das culturas mais antigas.




Mesmo os mais evoluídos, como os egípcios honravam os mortos não só com pirâmides, mas com a bênção de Anúbis, preparavam os corpos dos mortos para a próxima vida, mumificando e seprando em vasos sagrados os órgãos mais importantes, cumulando o espaço do túmulo com comida, água, servos e servas e todos os objectos necessários para o conforto do falecido. Acreditavam que, tal como as cheias do Nilo matavam e criavam vida, viver e morrer e tornar a viver pertencesse ao mesmo ciclo.




Todas as culturas acreditam numa alma que vive num corpo por algum tempo, desprendendo-se dele assim que mais não seja necessário usa-lo. Das almas dos guerreiros de Odin, conduzidos pelas Valkirias ao Valhalla, do império Inca, aos cultos dos índios norte americanos ao General com guerreiros de terracota na China, em cada ponto do mundo o culto da morte era algo normal e fazia parte de tudo o resto. Cruéis ou não, certos ou errados, o que se sabe é que depois do advento cristão as coisas foram mudando um pouco por todo lado. O conceito de pagar faltas num Inferno eternamente (e sem chance de recuperação diante da infinita misericórdia de deus) e de bater asinhas nas nuvens ao lado de deus e dos santos foi passando de missa em missa, hóstia em hóstia e absolvição em bula papal sem grandes contestações.



Mas permanece dentro de cada um uma pontinha de curiosidade, um "e se" que se formula em pensamentos e reflexões, diante de toda a forma de vida que vai e volta nos ciclos de Primavera ao Inverno, de renascer e morrer para tornar a voltar. E questiona-se baixinho, sem fazer grandes ondas. No que antes estes pensamentos levavam que as fogueiras e autos de fé se fizessem, hoje tememos a opinião que os nossos pares sociais façam de nós. Os mesmo que também se questionam, ignoram as experiências pelas quais passam, não vão depois internar-nos todos, desacreditados e completamente entupidos de xanax e afins.

Poucos mas bons foram aqueles que remando contra a maré, contra a força de uma igreja cimentada em poder e influencias, dedicou a vida não só a entender e encontrar respostas para as grandes questões de vida após a morte, como usaram os preceitos básicos para ajudar o próximo. Não foram santos, nunca pediram esse cognome, apenas deixaram pistas  e modos de vida a serem seguidos. Deixaram livros, testemunhos e evidencias aos que justamente duvidavam disto tudo. Isto tudo é importante e mexe com as pessoas.

E a maior evidencia é esta: só aqui, no Teorias, um blog de uma escritora que nem é do jet set, nem aparece na T.V ou no Big Brother, só assunto Umbral é o segundo post mais lido desde a abertura das lides escritas. Por muito que se negue, que se esconda o facto, essa parte nossa de querer saber o que vamos fazer depois... está lá.



Em cada mostra de interesse, em cada pergunta que se faz é um pouco mais que se descobre de nós mesmos, do que já ouvimos ou assistimos. Mas ainda há quem tema as fogueiras em praça pública, que lucra com o desespero e o desengano e quem não perceba que, apesar de ser um assunto que faz parte da nossa vivência é um assunto sério e que merece o nosso mais profundo respeito, mesmo que não acredite em nada.

Quanto mais nos pedem para sermos racionais, acreditarmos nas provas, nas fórmulas e livros de ilustres eruditos da racionalidade, mais a nossa natureza, o nosso sentir mais primordial vem  ao de cima. E deixar de questionar, de querer descobrir é o que alimenta ainda mais os dogmas (um por que sim teimoso), o poder de uma classe que mesmo assim prega a ressurreição dos mortos após o Juízo Final... e isso não é uma reencarnação na mesma?????

Questionem

Enfrentem

Reflitam

... e apareçam.

Rakel

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