Quem diria que uma banhoca, num dia que nada dava certo, faria surgir não só uma formula inovadora (e mais uma para decorar em Física) como a mais célebre exclamação do mundo. Arquimedes, um tipo que pensava em coisas de uma utilidade restrita descobriu uma saída catita ao problema que lhe afligia. Assim do nada, depois de ter matado a cabeça e queimado pestanas, apareceu-lhe diante de algo tão corriqueiro como uma banho a resposta mágica. Largou o patinho de borracha na banheira, esqueceu de tirar a touca de banho e de cobrir os penduricalhos... e saiu para a rua, a gritar em plenos pulmões:
Eureka!
Achar soluções pelo método Arquimedes poderá, porventura, ser o mais indicado (menos a parte de sair em pelota pela rua, senão são uns dias na prisão ou no pior dos casos, num manicómio), largar o que nos aflige a cabeça e alma e olhar noutra direcção. Por vezes forçamo-nos a arranjar uma solução logo, rapidamente e perfeitamente. E dá merda. A pressão não ajuda toda gente, não somos todos bons a trabalhar sob pressão.
Falei nisso outro dia em conversa que andou por vários caminhos, naquele deambular próprio de jogar conversa fora, de rever situações cotidianas nossas de cada dia. O facto de só olharmos numa determinada direcção, não saindo da nossa zona de conforto e tentando, mesmo assim, encontrar soluções. Dizia-me então o meu interlocutor que, sair do país era impensável, em jeito de : "ora porra, nasci aqui, é o meu país, dei sempre o meu contributo, portanto ele tem que me dar o retorno", justificou tudo. Quando digo tudo, digo a teimosia de não sair sequer da cidade onde vive, de procurar outras opções em termos de trabalho, de tudo.
Deambula pelos mesmo cafés, faz as mesmas coisas aos fins de semana, faz férias sempre no mesmo lugar e aquilo que ele chama de hábitos arraigados, eu chamo de uma valente preguiça. Já pra não dizer outra coisa. Mudar de ramo... jamais, me dizia que estudou para isso, investiu nisso grande parte da vida, tem que haver uma solução. E se a solução for uma coisa completamente diferente, perguntei, se for algo que até gostes, mas nunca tentaste?
Um dos nossos mais conhecidos neurocirurgiões é um romancista consagrado, sempre achei que a profissão não definiria tudo numa pessoa, apenas se é ou não um bom profissional. Mas acima de um profissional está uma pessoa, que até pode gostar de dar umas pinceladas numa tela vazia, ou de fazer banda desenhada, esculpir em pedra ou até desencantar rocambolescas receitas culinárias. Isso fora do estatuto de advogado, serralheiro, psicóloga ou zoóloga. Definirá uma profissão o sentido de humor além da inteligencia, da audácia ou da arrogância?? Acho que não, acho que a forma como vivemos,as nossas aglutinações culturais e a nossa visão da vida nos vai acrescentando mais valias ao nosso baú pessoal.
Eu não posso falar por mim, acho que não há uma coisa só que me defina na totalidade, já trabalhei em coisas tão diferentes umas das outras, que não me fez especialista em nada, mas empenhada em tudo... e com experiencias várias. Guardo-as todas muito bem, umas mais que outras, mas de qualquer forma, sempre disposta a conseguir conhecer mais do que o habitué monótono. Mal de aquariana, dirão alguns, sorte minha, direi eu. :)
O que me dá uma certa satisfação e até mesmo um certo orgulho, é ver como algumas pessoas que viram os seus dotes restritos ao mundo do "passatempo" passarem a fazer disso profissão. Fazem com gosto algo que tomavam por brincadeira ou distracção. Melhoram, superam-se e maravilham-me. A mudança para mais e melhor sempre me maravilha, me encanta, mesmo quando eu não o digo directamente. Mas cá dentro me dá alegria.Um amigo que passou de empresário cheio de neuras para artista da imagem, como ele... outras e outros que abraçam mudanças e fazem a descoberta, um Eureka!! particular das suas capacidades e sensibilidades.
Do que sai do estúdio, larga o lápis e o estirador de desenho e o maldito computador e vai de evento em evento com as suas esculturas "macabras", as peças de bijuteria e descobre mais amigos, mais formas de viver. É a minha esperança cimentada que quer ver o romance escrito pela Bellona publicado ainda nesta minha encarnação. Da Stela e a sua nova vertente holística aprendida e posta em acção, dos tantos e quantos que vão dando oportunidade de atreverem-se a redescobrirem-se em outras áreas.
Delas e deles todos, sinto uma imensa felicidade de saber que procuram sair da zona de conforto, de não ficar teimosamente a espera, de braços cruzados e ar emburrado, que as coisas venham ter com eles, de não usarem uma desculpa qualquer pela inércia de vida. Pois ainda há quem só aceite as coisas dentro dos limites acanhados daquela licenciatura, num país atolado de licenciados sem emprego. E parece que aceitar um emprego fora disso, mais físico e menos glamouroso seja quase uma pena capital. E ficam sempre na espera e na mesma neurose, culpando tudo e todos pela má sorte. E tudo depende deles mesmos, apenas deles.
Apareçam
Rakel.
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