Forrest Gump e a Teoria da Caixa de Bombons


Nos meus tempos de adolescente despreocupada e um bocado avoada, motivo pelo qual caía com mais frequência do que a desejada, havia um fenómeno chamado "Amigo por Correspondência" . Um assunto interessante do ponto de vista de quem queria fazer amizades à distancia e regulado por um órgão oficial qualquer que agora me escapa o nome. Na minha escola corria uma lista de miúdos e miúdas de vários países do mundo que queriam corresponder-se com outros que tais. E não liguei nenhuma ao assunto.

Talvez fosse da minha tenra idade, a minha distracção habitual ao modismo, mas não achava lá muita piada escrever à alguém que morasse na Finlândia ou em Moscow. Mas que raio haveria eu de perguntar?? O que gostaria de dizer? Quantos anos tens? Como é a tua cidade?? Bahhhhhh....sem graça...

Já nessa altura achava que uma amizade era uma construção constante: as gargalhadas, as cumplicidades e frases em código, a linguagem corporal, a voz a maneira de encarar as coisas...tudo isso e mais as inevitáveis discussões e birras. Uma amizade que se preza é feita de tudo um pouco, algumas começaram até numa antipatia mútua que mais tarde se transformou numa sólida amizade. Portanto, quando deixei a terra Brazilis, levei um caderno cheio de endereços de pessoas que conhecia a sério, misturadas com aquelas que sempre vi como minhas amigas mesmo. E fui me correspondendo com elas, acompanhando as evoluções e as mudanças normais. 

Por isso mesmo, o teor das amizades mudaram, porque cada qual mudou de rumo na vida, tomou as suas opções pessoais. Mas lá bem no fundo, por muitas mudanças feitas, a gente ainda guarda uma essência do começo dessa amizade. Daquele caderno apenas ficou um nome, aquela amiga que pulava o muro da escola comigo, que foi suspensa comigo por duas vezes (nunca disse que era santa né?), que aguentou as minhas dores de cotovelo, as minhas neuras (e eu as dela como é lógico) e a única com quem podia falar de tudo. Tivemos intervalos enormes entre uma carta e outra, mas nem por isso menos interesse uma na outra, mudamos evidentemente, mas continuamos a saber uma da outra. Porque amizade é assim, altos e baixos, mas uma constante. Achei piada a última pergunta dela: "Continuas louquinha?"   :)

Por aqui fiz também as minhas amizades, as que mais acarinho são de longa data, entre elas, a da minha comparsa aqui no blog (eu sei, a rapariga anda fugida...é pena), a Belona e é tanto quanto chegue para fazer um trio de abanar os alicerces do mundo. Umas birras pelo meio, necessidade de espaços próprios, e o saudável respeito mútuo que faz de QUALQUER relação algo de duradouro e longo.

O advento FaceBookiano foi algo que sempre me fez um certo esgar facial. Mas que raio é essa cena de amigar e desamigar pessoa que nem sei quem são??? Portanto, o meu Face começou por ser de pessoas que conheço bem, amigos e conhecidos. Porque acho que acabar uma amizade é coisa de olhar bem nos olhos e encarar a verdade ruim e os desacordos.... enfim...

Aliás, o advento internauta serviu para abrir uma data de brechas que possibilitam conhecer pessoas, inclusive aqui neste modesto espaço bloguista. Fiz um par de amizades aqui no Teorias, digo amizade pelo simples facto de ter uma conversa inteligente e contínua (conforme o tempo disponível) que acredito sincera. E continua a ser na mesma base, umas birras pelo meio, umas gargalhadas e muita cumplicidade intelectual,  uma pessoa que tem uma postura assumida do que se é...valorizo imenso. Mais ainda quando consegue apontar os próprios defeitos com a mesma frontalidade que conheço bem os meus. São poucas as pessoas que se assumem tal qual são, sem elevar o ego ao nível dos píncaros universais ou fazer-se passar por aquilo que não é. Aí, os pés de barro partem-se logo. 

Esta semana, num dia que nem sei, comemorou-se o dia internacional da amizade, mais um evento calendarizado para comemorar algo que, ao meu ver, se estabelece no dia a dia, no respeito e dedicação que se lhe dá. 

Da minha parte, dei o braço a torcer ao facto de que, alguém que não conheço, que posso passar na rua e nem saber reconhecer (ok, sou um bocado pitosga e há 3 metros de distancia, pra mim é tudo igual), sei como pensam, as músicas que gostam, o tipo de sentido de humor, saber entender o vai e vem de mails. 

A vida ao jeito de Forrest Gump, sendo uma caixa de bombons dos quais não sabemos os sabores, vale o risco de uma dia apanharmos um sabor que nos amarga e depois encontrar outro que nos adoça a boca. 

Apareçam

Rakel.

Comentários

  1. Eu li, como outros textos de agradável leitura.
    Este tocou-me de forma diferente, e até especial.
    Como sempre e sem fazer favor, gostei.
    Sérgio Veloso

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  2. Miuda ser santa não é nunca ter feito asneiras, é conseguir continuar e melhorar apesar das ditas cujas!
    Xi, acho que hoje estou inspirada, deve de ir chover.
    Mas concordo com o que disseste sobre a amizade, também me faz confusão. O ser amiga de uma foto, que nem sequer sabemos se corresponde ao rosto de quem está a falar connosco. Não que a aparência importe, mas há demasiados aspectos não verbais que também são uma forma de comunicação.
    Puxando um pouco a brasa à minha sardinha, é completamente diferente a análise de uma testemunha que presta o seu testemunho na sala de audiências na presença de todos os intervenientes ou a de uma que o presta por video-conferência. É indiscritivel. E isto perante pessoas, com todo o respeito que merecem, mas que com alguma probabilidade não vais voltar a encontrar. Quanto mais alguém com quem pretendes fazer amizade e dares um pouco de ti.
    É óbvio k as distâncias tornaram-se tão relativas k são necessários meios acessórios de comunicação.
    Mas quando estás a falar com um desses amigos de longa data pela net não estás a visualizar a reacção dessa pessoa à tua conversa, o k chateia, o k provoca um sorriso?

    Jinho e bfds

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  3. Catekista...a coisa que mais me irrita é perguntar assim: "Olá, tudo bem?" e a resposta ser "LOL"...mas a vida é mesmo uma caixa de bombons...há aqueles de aspecto bastante apetecível, que depois de provar sabe mesmo... a nada. E outros que, comuns são de sabores especiais. Na vida, seja ela atrás de uma tela de PC ou na realidade...há de tudo. O truque? Nenhum, é ir vivendo e provando :)

    Bjos

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  4. Olá Sérgio! Bem vindo a caixinha de comentários e das tuas palavras, sempre tão gentis. Continua a passar por aqui e a deixar teus comentários, pois isso enriquece o espaço.

    Bjos

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