Anjos e Demónios


Um metro mal medido de gente, uns olhos grandes e azuis numa carinha de boneca loira, a voz doce e infantil compõe a regra da "carinha de anjo" da L. Não grita, o seu sorriso com dentes a menos é fatal e cativante...mas a miúda é uma pestinha encoberta por esses atavios angelicais. Se aparece asneira feita, ela lá no cantinho afivela o seu ar de "não parte um prato" e arregala os olhos de espanto. 

É mais ou menos assim que avaliamos as pessoas, tenham 8 anos ou 88, a cara, a estampa pode servir para ser o cartão de visitas da personalidade das pessoas. 
No séculos anteriores, vários estudiosos usaram as medidas cranianas para avaliar a personalidade das pessoas, desde o psicopata ao erudito. Juntaram a isso a morfologia facial, desgraçado de quem tinha os olhos muito juntos ou pequenos: era violador na certa.

Portanto, o inteligente, educado e sensível Merrick (o homem elefante) deveria ter sido morfologicamente pior que Hitler, nestes parâmetros de medição e avaliação exterior.

Mas os deturpados mentais, os piores, vem em embrulhos inocentes e angelicais. Passando pela papelaria do costume para comprar cigarros, bato os olhos numa destas revistas de conteúdo mais ou menos aprofundado, onde vinha a chamada de atenção sobre a história do autor do massacre de Oslo, o demónio com cara de anjo...

Só por aí dá pra desconfiar de cada vez que olhamos para alguém muito acertadinho exteriormente, dá um certo frio na espinha. Aliás, a história das aparências tem sido um constante quebra cabeças na minha actual vida. Uma coisa é certa, os anjinhos, por culpa dos pintores e da estética da época, sempre foram associados aos loirinhos de olhos claros. Peguem em todas as pinturas, vá.. desde o Barroco até agora, de anjos à Jesus... é tudo loiro. Se Jesus era filho de mãe judia, caraças, teria que ter traços que não fossem do caucasiano europeu, loiro, de olhos claros e pestanudos...

Mas a merda da estética pega melhor assim, nesse ar frágil e doce. Bem...menos nos nórdicos, que apesar de clarinhos tinham uma personalidade do catano. Mas regra geral, propagandas, publicidades, lá está a mesma fórmula.

No caso de Anders Breivik, o pacato e de voz doce cidadão, nada faria prever que dentro daquela dourada cabecinha fosse um verdadeiro manicómio. Não, ele não se via como um Napoleão, um César ou até como o lesado mental do INRI Cristo, nisso ele foi mais modesto. Apenas se arvorou em cavaleiro na senda da guerra santa. A dele, é lógico, mais um fundamentalista que se acha a solução do mundo. Uma pessoa que carrega tamanho ódio, que não consegue ver a aberração que é matar como solução para as suas frustrações pessoais, é de longe assustador. E pode ser aquela pessoa que passa por si na rua, com uma cara simpática, com hábitos recatados e normais. Não dá para avaliar nada olhando pra estampa de uma pessoa. Cada qual guarda dentro de si certas pulsões que não dá pra prever, desejos encobertos...


Por isso gosto dos maluquinhos assumidos, dos que não tem pejo nenhum de serem aquilo que querem e que são. Gostos dos que muitas vezes chamam de mal comportados e selvagens, os que se colocam na obscuridade. São os que muitas vezes são os mais doces por dentro, mais abertos para a vida e que mais a respeitam. Tenho o caso da B. uma pestinha assumida irriquieta, canta , pula, dança e foge toda hora, 7 anos de pura adrenalina. Outro dia, chuchando o dedo e com ar abatido pediu-me colo. Essa não era a B. normal, peguei-a e aconcheguei-lhe a cabeça na curva do meu ombro...

"O que se passa B.?"

Ela deu de ombros...

"Vá lá..."

"Hoje a professora me deu bola vermelha..." disse ainda com o dedo na boca

Bola vermelha é certo e sabido que se portou mesmo mal, que passou dos limites e que o pai iria ralhar com ela em casa.

"O que foi que aconteceu então??"

"Os miúdos do meu lado disseram uma coisa engraçada e eu fiquei a rir e a professora disse pra que eu calasse e não consegui calar" tudo dito de rajada e já a chorar...

A L. tem uma carinha de anjo de enternecer até os arcanjos, ninguém acredita que aquele pedacinho franzino de gente seja capaz de uma patifaria. Por outro lado, a B. é um furacão infantil extravasado e assumido...uma sonsa angelical, outra assumidamente criança. São crianças, é certo, vão construir durante toda a vida a sua personalidade, hão de surgir as inevitáveis mudanças...mas algo me diz que a L vai ser sempre uma sonsinha e a B uma louquinha como eu, com sentido de humor e incompreendida  :)

Não quero generalizar nada, isso seria um preconceito absurdo, um julgamento feito na base de um estudo e teorias tão empíricas e sem jeito como o contrário se faz. Seria uma ingenuidade parva. Mas já apanhei assim com umas traulitadas na cabeça com essa cena do "quem havia de dizer..." 

...e se me permitem

Um Anders Breivik, com tamanho ego distorcido e incapacidade de viver no mundo real, não pode ter agido sozinho. Uma pessoa assim precisa de seguidores tão ou mais frustrados do que ele. O facto de estar constantemente a repetir que pensou e agiu sozinho, mais reforça a minha teoria de que ele tem mais gente a espera que a poeira baixe e que novos ataques aconteçam. Um lesado mental que faz um manifesto de 1.500 páginas, onde faz as suas declarações fanáticas precisa de ter à quem mostrar. Precisa que sigam os seus sonhos e que tornem realidade o mundo que desejam. E há praí uma data de Anders enrustidos em mocitos pacatos, de boa estampa e que parecem com a L. Parecem que não partem um prato...

...partem é o louceiro todo e ainda fazem cara de "não fui eu..."

Apareçam

Rakel

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