Acho que foi no ano passado que falei da minha relação pouco amigável com o tempo, essa questão tão agarrada a nós como uma lapa. Mas, indubitavelmente estamos escravizados pelo escoar do tempo, mesmo que por vezes façamos batota, tentamos enganar um bocadinho as coisas...vai contando e descontando da soma final.
O que mais me enerva nisto tudo é a ambiguidade que há numa coisa: geralmente, os pais dizem aos filhos adolescentes, que eles não sabem nada, que não sabem o que é melhor para eles, e que "enquanto estiveres na minha casa as coisas são como eu quero!" Mas por outro lado, as exigências da vida impõe aos cachopos de 15, 16 anos que decidam de vez aquilo que vão ser para o resto da vida. Exigir uma escolha de profissão, a área que vão escolher, mesmo que não possa escolher outras coisas, porque os pais sabem tudo.
Outro dia, com uma miúda abraçada a minha cintura, com quem conversava sobre a chegada das férias grandes...bem, deu-me que pensar por vários motivos.
Eu ia dizendo que, agora chegadas as férias, que brincasse bastante, que se divertisse o mais que pudesse, pois para o próximo ano lectivo, ela iria para o 5º ano e seria muito diferente.
"Rakel, qual é a profissão em que se ganha mais dinheiro?"
"Queres saber isso porque?"
"É para quando chegar ao fim do 9º ano, poder escolher a minha profissão...nem sei se hei de ir para um curso profissional, se hei de ir para a faculdade... não sei"
" B, mal acabaste a primária, já estás a pensar no 9º ano??? E queres saber a profissão que dá mais dinheiro??? Pois olha, agora sou eu que te pergunto: o que gostas mais de fazer?"
Ela deu de ombros, como quem diz "sei lá eu bem"... Uma menina de 9 anos de idade, preocupada com a questão profissional, quando deveria estar a viver a infância dela, guardar boas recordações, para depois sim, com cabecita e algum conhecimento do mundo, escolher aquilo que há de ser a sua profissão. Aos 9 anos preocupada em pensar se vai para um curso profissional ou faculdade, ganhar dinheiro é sinónimo de sucesso e bem estar... caraças...
Meu filho mais novo, que transitou para o 11º ano, tem muitas coisas definidas, que as chamo de provisórias, e passo a explicar porque. Na cabecita cabeluda dele, é acabar a escolaridade, fazer o curso de enfermagem, e depois um curso de fitoterapia. Depois de concluir estas duas etapas, quer fazer parte do corpo de médicos e enfermeiros da AMI. Embora ache muito meritória escolha, um bonito gesto de fazer uso das suas capacidades...uma coisa é certa: ele tem 16 anos. Acredito que estas escolhas DELE (e friso bem a palavra, porque NUNCA o influenciei) tenham sido muito bem pensadas, reflectidas e ponderadas. É do feitio dele esquematizar tudo muito bem. E desde que começou a ter filosofia como disciplina... bom, começou a questionar mais o papel dele como parte integrante da sociedade.
Confesso que isso me deu um certo medinho.... conheço aquele olhar idealista militante de quem quer mudar o mundo de forma bem activa. Eu me vi nele, ali, cara a cara, a mesma franjona a tapar um dos olhos, o mesmo discurso que fiz aos meus pais na mesma idade. Não tive medo porque não acredito em ideais, me deu medo sim, que ele passe pelos mesmo desgostos que eu. Os cinismos, hipocrisias, o ter que caminhar muitas vezes teimosamente só na escolha que se faz, ter braços bem fortes pra remar contra a maré...
A única diferença nesse cara a cara com o meu filho, é esta: nos meus 16 anos, quando disse que queria estudar arqueologia, meu pai apenas disse que ia ser arquitecta e pronto, sem discussão e ponto final. Pelo meu espírito de contradição de nascença, nem fui uma coisa nem outra. Aos meus filhos apenas pedi uma coisa:
Façam aquilo que gostem, invistam nisso, se por acaso a meio do caminho perceberem que não é isso que os realiza, que não é essa a profissão que os apaixona, que façam um favor à eles mesmos... mudem. Viver na frustração de não ser o que quer, apenas ser um meio de ter algo, algum conforto... não chega. Há tempo... há imenso tempo de decidirem. Nunca é tarde... o relógio faz Tic-Tac e ding-ding...mas o tempo passa mais devagar quando não fazemos o que queremos, arrasta-se interminavelmente para nos vermos livre do local que não gostamos de estar. Acredito nos ideais, acredito naquilo que temos dentro de nós para dar, mesmo que hajam uma data de botas de elástico a dizer que "são sonhos". São sonhos?? Talvez sejam.. mas realizem alguns.
Há quem faça por atrasar sonhos apenas para conseguir alcançar mais um degrau na escala de trabalho e ganhar mais algum dinheiro... mesmo que deteste o que faça. Conheço imensa gente que anda a rasca de dinheiro, mas adora o que faz, e ainda tem mais garra e vontade e muito menos derrotismo dos que ganham muito e se arrastam para o trabalho. Atrasam tudo numa parte do relógio, apenas para ganhar uns segundos no cronómetro...
Eu gostava de dizer para aquela menina, a B. que ela tem imenso tempo, que ela vai acertar e errar nas escolhas, dizer o que disse aos meus filhos: experimente as várias escolhas, mas que façam o favor de nunca ficarem presos à nada nem ninguém porque pensam que já não há tempo para mais nada. Há sempre tempo... e da vida só podemos levar as experiências, porque que eu saiba, caixão não tem gavetas para levar dinheiro...
Rakel.
E daquilo k te conheço acho k posso dar graças a Deus (estou a começar a candidatar-me ao excomunganço do costume) porque ainda não perdeste o idealismo. Sabes avaliar as coisas com os pés na terra, mas continuas a saber sonhar.
ResponderEliminar(e agora é k eu vou formalizar a minha candidatura à excomunhão perpétua)
Ainda há muito daquela menina k trabalhava numa associação católica (não me lembro qual) e era a representante das outras intervenientes. Sim, porque esta menina (agora gostaste) k tem uma mistura de ideologias extremamente interessante, nunca foi católica, mas colaborou com eles.
E eu acho isso muito de louvar, e k tento sempre colocar em práctica:
FAZER O BEM SEM OLHAR A QUEM!!!
Han! Então fui excomungada ou fiz vir uma lagrimita no olho?
Jinho
Nem uma coisa nem outra... afinal, não tenho aptidões para excomungar ninguém. Mas fiquei com um sorriso, porque afinal o grande lance da vida é esse mesmo: fazer as coisas certas, sem medir ou justificar o motivo. É o correcto, portanto é pra fazer!
ResponderEliminarSabes lá a trabalheira que me dá ser idealista e ter os pés bem fincados no chão...mas foram tantas a traulitadas da vida... que um dia a gente aprende!
Bjocas :)