Be Cool


Uma pessoa ser Cool, fixe, Boa Onda, (whatever) é um assunto bicudo, porque quem é boa onda, não é só sorrisos, sentido de humor, tem o resto do pacote básico de todas as pessoas. Aporrinhações, problemas, chatices, contas, desentendimentos, contas (eu falo duas vezes delas.. porque aparecem em ninhadas e não nos largam) e gestões pessoais.

Toda gente olha para o "Cool" e pensa-o invulnerável, há uma aura de que nada, absolutamente nada poderá atingir o Boa Onda e que portanto, é a escolha certa para desfiar as suas próprias vivências complicadas. Aí, aquela pessoa fixe e espirituosa escuta com atenção, deixa desabafar tudo e para aliviar o ambiente, diz alguma coisa engraçada misturada com uma grande verdade. Aliás faz mais ou menos como uma mamã, que diz que todos são maus e que essa pessoa tá certa, depende do tipo de problema.

E o Cool vira um tipo de aspirina, quando há uma dor de cabeça qualquer, é procurado, e depois do alívio rápido da dor e de umas gargalhadas, volta à condição de amigo de ocasião e fica tudo assim arrumadinho. Mas experimente multiplicar isso por 5, 10 ou mais vezes ao dia. Quem me lê, poderá pensar: "Se são problemas dos outros, porque raio haveria de nos incomodar?"  Incomodam, pelo simples facto que, o Boa Onda, só o é , pelo simples facto de prestar atenção aos problemas dos outros e não dar de ombros e fazer cara de enfado quando alguém os procura para desabafar.

A maior parte das pessoas estão centradas e orientadas para o próprio umbigo, o que se passa com os amigos e conhecidos... não é mais do que um incómodo passageiro. Ouve sem escutar, diz qualquer coisa circunstancial e socialmente correcta e tá tudo bem. O Boa Onda xinga junto, rosna junto e até chora junto com quem tá enrascado. O Cool anda sempre com lenços de papel, e sabe exactamente onde deve encaixar a palavra correcta. Mas...


...no fim de um dia em que descobre que uma amiga de 33 anos tem cancro do peito, que outra lhe conta da doença do filho, outra chora de desespero por causa do desemprego e das contas a acumular...e dos próprios problemazitos do Cool... a corda estoura para algum lado. É que é bastante complicado ficar com uma amiga abraçada à nós, a chorar com medo da cirurgia, da quimioterapia (e todas as coisas que vem junto com isso), de arranjar firmeza em afirmar categoricamente que ela vai se curar e tudo vai ficar bem, de arranjar argumentos e saídas para acalmar a alma de quem se vê sem trabalho e com a corda no pescoço. Depois tentar achar alguma resposta e solução para o filho da amiga. Inevitavelmente, o fixolas olha para os outros e para si mesmo e se pergunta... porque raios a vida é tão filha da puta, tão cheia de merdas? O que toda gente quer ao fim das contas... é ser feliz.

Daí que nesse final de dia, de corda esticada até ao limite pra ser Boa Onda, há uma certa irritabilidade que pode dar em dois resultados: ou vira piegas ou não leva nada a sério e brinca com tudo.
O lado piegas, junta no mesmo cesto o mal dos outros e o próprio infortúnio e debita uma data de choradinhos e lamentos contra o mundo cruel e chega a ser patético. Torna-se chato, porque faz as suas tempestades e vendavais.... e nem sempre entendem bem isso.
Quando bate no lado sarcástico e que não leva nada a sério.. aí é bem pior. Porque na verdade, para aliviar o ambiente, para conseguir fugir um bocadinho do dia todo, brinca muitas vezes com coisas demasiado importantes para outras pessoas. Mal de quem não conhece a sério o Coll, mas conhecer mesmo, saberia que nos dias que joga pra fora uma data de parvoíces.. é porque foi um dia mesmo mau.

Geralmente, um Cool tem uma mão mal cheia de amigos que percebem o humor corrosivo e as bocas foleiras. Da falta de tacto em comentar algum assunto ou dar o devido valor ao que se passa. É verdade, o fixolas PRECISA  de aliviar um bocado as coisas e brinca demais. Pensando bem, o fixolas deveria era "pegar na trouxa" e ir para o seu "tempo de montanha", deixar de lado tudo e ficar bem quieto e caladito, não vá de alguma forma criar mal-entendidos. E esperar que haja alguma generosidade da parte dos amigos, que saibam dar prai uns 50% de desconto desse tempo de qualidade e de mal dizer do fixolas.

O Cool, o Boa Onda, o fixolas tem problemas. Não é em nada diferente dos outros, mas tem essa mania irritante de achar que é bem melhor brincar do que dar murros em ponta de faca. Raramente fala de si e dos seus problemas, aqueles mesmo que os atormenta, e quando faz... se arrepende de seguida. Não é uma questão de falta de confiança... é vulnerabilidade. O Cool veste há tanto tempo a capa de que nada o faz tremer na base, que quando se abre e mostra esse lado.. se sente nu. Não é uma sensação muito boa...né?

Por isso mesmo, se quem me lê conhece e tem essa benesse de ter um amigo fixolas, que no fim das contas é a sua aspirina...trate-o com a amizade e desconto que merece. É que ele te escuta mesmo, não é daqueles que dá de ombros e diz: "é.. a vida é lixada...mas é assim mesmo."

...isso a gente já sabe.

Apareçam

Rakel

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