E veio de mansinho, sem dar muitos abalos, entre vivas e fogos de artifício, como manda a praxe, o ano de 2020. Mal sabíamos nós que seria um pimparote no meio da testa de tanta gente. Nunca imaginamos que seria a mostra do melhor e do pior da humanidade.
Políticas à parte (já que no mundo democrático, as escolhas são feitas mediante o voto popular) cada pedaço do mundo embateu com o inesperado vírus, que não só talhou a vida de muitas pessoas, como abalou a economia de um mundo globalizado e interdependente.
Francamente, para mim, uma modesta cidadã do mundo, uma anónima na multidão, tenho que dizer, que depois de uma análise descomprometida e desapaixonada, até não foi um mau ano. tenho para mim, no nível pessoal, o ano de 2016 como meu Ano Horribilis. Portanto, depois disso, nada mais me abala.
E percebi como as pessoas vivem numa inconstância de necessidades: se tem uma vida agitada, com pouco tempo para a família, a casa, o bem estar. Que se queixa que a rotina puxada não permite ler, dedicar-se à um passatempo ou até mesmo apreciar aqueles velhos discos e CDs... a pandemia ofereceu essa oportunidade de bandeja.E nem assim houve satisfação ou sequer tomar partido da situação para fazer um ponto de paragem e uma auto avaliação.
E durante o ano de 2020 pudemos assistir ao desespero de quem não pode viver sem concertos e festivais; de quem não suporta ficar no conforto do seu lar a trabalhar (um sonho por mim há muito acalentado) com os filhos ali debaixo de olho e o seu companheiro/a escolhido dentre tantas possibilidades. E descobriram que a convivência diária com as birras, o mesmo percurso de idas e vindas pela casa, o fim de assunto e começo de aborrecimento acompanhado, pôs em causa alguns dos alicerces da instituição familiar. Houve quem achasse cruel e até uma violência, passar 24 horas por dia com os filhos.
Sei de alguns naufrágios de relacionamentos, um encolher de ombros já esperado e a esperança de dias melhores e de novas oportunidade. Afinal o slogan era "vai correr tudo bem" e que depois daquela que foi a primeira vaga, teríamos todos aprendido muito. Seríamos melhores, seríamos diferentes. Certo?
Bom, vendo por uma perspectiva baseada na observação, dei-me conta que se mudou...não foi para melhor. Há uma raiva e ódio contidos em modo de barragem, que ao menor pingo resulta em enxurrada.
É o assistir dos que exigem ser aceites pelo que são, que defendem o direito à diferença, dos que clamam e postam nas redes sociais o "viva o 25 de Abril e a Liberdade" a não permitir que os demais tenham o seu próprio e salutar direito à diferença, a escolha, liberdade de pensamento e expressão. E é assim, se não és com o rebanho, és contra o rebanho. Uma ditadurazinha medíocre de um grupo que luta, dizem eles,pelo direito a diferença.
Durante esse tempo, do fazer o pão em casa, dos diários de bordo ao estilo Star Treck e de vlogs de tudo e mais um par de botas, comecei a prestar atenção à tela da TV, e das coisas que fui descobrindo.
A primeira foi que, tanto quanto pensava, ter tv por cabo não nos isenta das propagandas. Pensava eu, na minha santa ignorãncia, que pagar bem pelo serviço chegaria para não ter que gramar com anúncios do supermercado que vende mais barato, nem do sabão que lava mais branco ou do seguro que cobre tudo.
Depois também me deu que pensar se os diversos canais estão todos no mesmo prédio e andam a trocar os DVDs dos filmes entre eles em períodos regulares. E descobri uma coisa interessante:
Você que não consegue passar nas eliminatórias do Ídolos, The Voice e almeja cantar na pequena tela... junta-te à uma qualquer fé que usa o canal que comprou e cante os hinos da fé em modo cantor de churrascaria, com muito vibrato e aquela panca canastrona. Pode ser que nunca venha a gravar nada, ou que saia na Nova Gente, mas pelo menos mata o bichinho de ser cantor, de microfone na mão e reverberando qual cotovia.
Na Internet, e nas minhas andanças, descubro que qualquer pessoa que vista um jaleco com botões laterais, que faça um mini curso de culinária, abre um canal no YouTube e auto intitula-se Chef. Há gente séria que sabe o que está a fazer, há gente que espera que o logarítmico permita ganhar uns cobres e leva mais de metade do vídeo a falar de absolutamente nada e que a receita leve menos de 5 minutos a fazer. Há uma que depois de dar a receita lê uma passagem da bíblia e vemos ali que há pastora e pouco de cozinheira, já que aquilo que faz é uma cópia de outros criativos.
Acompanhei o caso Johny Depp e daquela desacelerada mental que disse: "ninguém vai acreditar em ti por que és homem. Vão acreditar em mim que sou mulher." E como tudo na vida, as coisas descobrem-se, as carecas ficam à mostra e...foi uma vergonha total. Quem o convidou a abandonar os filmes vê-se agora a levar com o reverso desse apoio cego e demagogo. Bem feita Disney...bem mereces.
Passou a segunda vaga, e não, ninguém aprendeu com os erros e tudo e tudo. Mais uma quarentena, mais um afundar económico e vem a terceira vaga e nada de novo se avizinha. Vacina que não tem sido lá essas coisas, e pelo estudo que li, a eficácia perde-se em pouco tempo. Há quem tenha levado a vacina e tem zero de imunidade. Em cada 3 pessoas actualmente internadas, uma já teve a doença. sendo uma reinfecção em cada 3, o que é muito.
No entanto, acreditando no tio Darwin, estamos a passar por uma selecção da espécie, seja por meio de mão alheia, seja pela flagrante estupidez humana, daqui até vir a ser uma gripe normal, será uma espera de pelo menos 10 anos. São 10 anos penhorados na incerteza dos comportamentos, de toda a capacidade de adaptação e de perceber que é preciso mudar em todos os aspectos.
E enquanto o mundo se descabela e desespera por tudo e mais alguma, eu que sou do contra pelo que dizem as más línguas, sinto-me bem. Não ganhei peso e tenho que dar o meu voto ao meu médico que disse que o stress engorda. Tem sido tranquilo, tem sido proveitoso. Tenho uma nova paixão, a juntar-se às outras todas. Li tanto quanto quis, conversei (pelos meios disponíveis, e é para isso que serve a tecnologia) tanto quanto quis. Aproveitei a família, e nos filhos que vão inevitavelmente procurar os seus lugares, seguirem com as suas vidas.
E aquilo que foi um par de anos fora do comum (e não, isto ainda está longe de acabar), de tantas convulsões sociais e manias pegadas de estaca, andei só da bancada a assistir essa "lição que a pandemia deu" que ninguém ligou ponta de corno, que não mudou grande coisa das mentalidades e que só mostra o quão auto destructivos são os seres humanos.
Inté....
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