Alegria Alegria


Coloco aqui o título de uma música de Caetano Veloso como abertura deste post, pela simples razão que há estranhas coincidências.

Esta música foi vencedora de um Festival de Canções no Brasil em 1967, em plena Ditadura Militar, com direito a uma quantidade considerável de PMs e demais forças da ordem presentes (não fosse os subversivos darem o ar da sua graça) e num Brasil que torcia o nariz aos sons de guitarras eléctricas.

Pois um desconhecido baiano, fez uma letra fantástica, usando uma frase de um não menos subversivo Jean-Paul Sartre e se junta com um grupo de guitarras e sons electrónicos de argentinos erradicados no Brasil (olhem só pra estes gajos, fogem de uma Ditadura Peronista e vão pra outra ainda mais gira...) e dá as caras no Festival da T.V Record.

Num Brasil onde a ordem era "Brasil Ame-o ou Deixe-o" tipo, se não gosta... faz boa cara e sorri, se reclama... a porta da rua é a serventia da casa...temos que sorrir mesmo quando não se sente alegria... a música fala das contradições disso tudo. Muito boa gente foi sorrindo e cantando mesmo contra vontade, porque assim, o postal do país tropical, ficava bonito. E o mundo via não uma Ditadura, mas uma Ditabranda. Mostrava que o povo gostava do que via e vivia, as arbitrariedades, o silencio velado das injustiças e a ignorância do povo pobre e faminto. Mas a ordem era : Alegria Alegria!!!

Agora chego à razão do post: o que eu antes considerava uma qualidade minha, torna-se cada vez mais um grande defeito. A minha memória. A minha e colectiva, pelo simples facto que interajo com o mundo que me rodeia, me envolvo nas questões que me batem à porta e não consigo fazer de conta que não existem ou que não existiram. Porque foi nessa base que muitos brasileiros viveram e vivem, esquecendo tudo e vivendo no Oba Oba, Alegria Alegria.

Não consigo fingir alegria quando não a sinto, porque acho que Alegria e Felicidade tem que ter alicerces dentro da gente bem fundamentados. Posar de boba alegre não dá, cansa e é mentira. Finjo mal, porque embora possa sorrir por fora, da boca e dos dedos saem palavras que traduzem os estados de espírito. E quem já passou pelas mesmas coisas, quem já se viu sem vontade de gritar Alegria Alegria, se esqueceu disso tudo... das acusações sem nexo, das picuinhas, perguntas absurdas e de dar sentenças à torto e a direito sem ver onde os tiros acertam.

Também não consigo fingir que tá tudo bem com o sofrimento alheio, não me diverte nada. Se pudesse escolher, preferiria que as coisas fossem vistas pelo mesmo prisma que o meu, sem problemas e contradições.

A Felicidade e Alegria dos outros não me incomoda, muito pelo contrário...é o que me conforta enquanto não chega a minha. Porque todo mundo merece ser feliz, cada qual da sua maneira e na sua justa medida e que a saiba cuidar. Dá-me paz saber que estas pessoas alcançaram o seu momento de Glória, depois de terem passado por coisas ruins, tristes e bastante difíceis. O que me incomoda e custa é a falta de memória delas, que embora tenham jogado pra trás tudo que lhes aconteceu, não sabem enxergar o reflexo do espelho nos outros. Parece que é quase como aquela música do Chico Buarque, que quando uma pessoa está bem, "...toda gente era obrigada a ser feliz...", pelo simples facto que se quer.

Mas pelo jeito, da maneira como as coisas são e estão, o certo e aceitável é dizer que está tudo bem, que tá tudo numa boa, Oba Oba, Alegria Alegria. Enquanto não estiver devidamente doce Q.B e racional na medida correcta, fazendo-me de esquecida, vou ficando por aqui no meu lugar.

Meu desejo sincero: que aproveitem os bons momentos, que se divirtam, amem muito, sejam felizes e façam a manutenção disso tudo. A vida é bem mais interessante assim, mais válida. Curtam o Verão (mesmo que esteja assim pro lado do chuvoso), mar, montanha, desde que seja com a natureza...força na peruca.

Mas não se esqueçam: vivam com coerência, com o que sentem de verdade.

Apareçam

Rakel.

PS: Se algum patrício meu aparecer por aqui e começar a querer a mandar abébias, de que eu não sei do que tou a falar...ficam aqui não as minhas palavras, mas de um brasileiro que vê as coisas como elas são.

Comentários

  1. O facto de se estar triste, é normal e humano mas não nos dá o direito de estar amargos com os outros que não contribuíram para a nossa infelicidade! Essa também aprendi, contigo!

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  2. Podemos e devemos ser críticos, mas se o somos, temos que aceitar que também somos expostos a críticas dos outros. Quando, sabiamente damos lições de moral também as devemos aplicar nas nossa vidas...beijos e vê se melhoras!

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